14.11.11

 

A morte. Sempre a morte.

Estava ali. Havia algum tempo que estava ali. Naquele lugar onde uns se escondem e outros receiam entrar. Estava ali, na dor. Estava ali há algum tempo, nem muito, nem pouco, que o tempo nunca tem essa qualidade. Estava só ali. Imóvel. Uma mão presa à vida, que por muito que negasse estava mesmo ao lado, em todo o lado. Outra mão presa à morte, que não aceitava, teimando por isso em não largar. E a sua alma... A sua alma vagueava algures entre aquelas duas paragens, nunca se dando a nenhum dos lados com algo mais do que um tímido acenar por detrás de uma cortina translúcida, mas fechada. E aquela casa afinal era deles. Tinham lá estado, ainda estavam, voltariam a estar, uma qualquer destas ideias era tudo o que lhe bastava para continuar. Imóvel.

E a memória do jardim, do jardineiro. Havia feito um pacto com ele. Sem palavras. Se o jardineiro não soubesse já quem roubava as rosas do jardim, ficou a saber no dia em que inesperadamente dele se aproximou, oferecendo os seus préstimos para ajudar a cuidar daqueles seres plantados. E assim foi roubando rosas ao jardim, sempre que o amor lho segredava ao ouvido.

Sinais da vida. Sempre sinais da vida. Desta vez era o jardineiro que lhe tocava à porta. Não quis atender, preferiu manter-se no crucifixo. Só de lá subiu para a rua passadas umas horas, em anonimato.

Nessa altura ao sair de casa, reparou que já não estavam no mesmo sítio os pés de roseira, há uns dias partidos, pela forte tempestade que por lá passara. A terra de onde nasciam estava agora arada, mexida, virgem de novo. O que restava do velho roseiral pronto para seguir a sua viagem. Parou os seus olhos ali algum tempo. Sempre o tempo, sempre algum tempo. Mas de súbito, sem comandar ou entender, fizeram seus olhos uma quadratura, do chão onde há muito estavam, para a frente onde agora pousavam. Pousavam em camélias, cinquenta, cem, talvez mais de duzentos botões de camélia. Teriam estado sempre ali? Seguramente que não, ou talvez não se recorde, ou talvez apenas se recorde dos pés de roseira. Poemas à espera da escuta que os leve à escrita. Escutou fundo e voltou para casa, em jeito de quem não enjeita rematar o poema das camélias. Juntou as roupas que ficaram, uma manta que algumas vezes os destapara aos dois, uma foto escondida algures no mofo de uma gaveta e uma escova de uns dentes, que tinham sido lindos, mas já não podia saber se eram. Juntou ainda as cartas. As que tinha recebido e guardado, as que escreveu e nunca tinha enviado. Fez um embrulho com tudo, o que ocupava pouco mais do que uma saca plástica, do tamanho de uma prisão. Colocou tudo na carruagem de primeira classe, ao lado daquela onde viajavam as rosas. A morte. Sempre e só a nossa morte.

De volta a casa, sentiu pela primeira vez as gotas de água que a tempestade deixara aos botões de camélia. Encostou-lhes os lábios, há muito cansados de estarem secos.

De volta. De volta à Vida.

 

Vladimiro Fernandes (articulista convidado)

 

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10.11.11

 

Aqueles 20 metros que distanciavam o 5º andar onde vivia e o chão que pisava todos os dias para levar as crianças à escola, separavam a minha ansiedade entre a vida e a morte. Começava a evitar ir à varanda, pois sempre que isso acontecia, pensamentos, que na verdade não desejava, assolavam-me e permitiam-me questionar se não seria mais fácil acabar com tudo ali mesmo. Parecia tão fácil, tão acessível, tão rápido! Aqueles 20 metros definiam a diferença entre estar vivo e não estar, entre sofrer e não sofrer, entre sentir e deixar de o fazer. As crises de ansiedade começavam a ser mais regulares, a falta de ar, a frustração de não conseguir atingir a paz de alma que desejava. A crise, as dificuldades económicas, pareciam motivos insuficientes para que tais pensamentos navegassem em mim, mas o cansaço fala muitas vezes mais forte e retira-nos o discernimento que se quer coerente em situações mais difíceis. Deixei de ir à varanda. E se o fazia, não me aproximava do muro que me permitia abeirar dos metros que me separavam do chão, e quando o fazia olhava para o sol, ou as estrelas, e permitia-me admirar a beleza que me rodeava. Quis viver. Escolhi viver. E atravessar esses 20 metros, de elevador ou usando as escadas, e continuar a levar os meus filhos todos os dias á escola… permiti-me continuar a vê-los crescer e ter a certeza de que aqueles sorrisos, o brilho do sol, ou a luz das estrelas me bastavam para ser feliz.

 

Sónia Pessoa

 

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7.11.11

 

“De volta à vida”.

Não me ocorre dizer muito a propósito. Não tenho experiências pessoais suficientemente interessantes para contar. Nunca voltei, porque nunca fui. Tenho-me mantido por aqui.

Podia falar do caso do meu pai, que depois de um enfarte do miocárdio, teve de ser ressuscitado com choques elétricos. Não sei quanto tempo esteve “ausente”, ou “morto”, já agora. Ele próprio nada tem para contar. Não se recorda de ter visto nenhuma luz branca, nem de ter tido nenhuma outra experiência transcendente com que nos pudesse surpreender. Não se lembra de nada.

E voltou exatamente o mesmo. Logo que pôde levantar-se da cama, tentou convencer uma enfermeira a dar-lhe um cigarro, às escondidas do médico.

O seu renascimento para a vida, nada trouxe de novo. Não lhe abriu o espírito e ele não se questionou sobre o sentido ou o valor da vida. Pensou apenas que se tinha “safado”, a custo, e que dali para a frente, tinha de ser mais cuidadoso.

Mas ele era ele, antes e depois, e como seria de esperar, não foi cuidadoso o suficiente e passados alguns anos, teve que ser submetido a uma cirurgia coronária, com triplo bypass. Dessa vez, pensou ter esgotado as oportunidades que a vida lhe oferecera e tentou, com relativa convicção, mudar de vida, achando que tinha renascido mais uma vez.

“De volta à vida”, terá pensado ele e nós.

 

O tempo passou, a vida foi de novo sendo tomada como algo garantido e seguro e ele voltou a ser quem sempre foi, vivendo o seu dia-a-dia, sorvendo o momento em cada passa de cigarro.

De vez em quando, se lhe perguntarem, talvez fale sobre a sua passagem pelo hospital de Coimbra, sobre o médico que o operou e concluirá mais uma vez, que a sorte lhe sorriu, sem saber de facto porquê. Logo a seguir, o mais provável, é que se lembre de alguma história mais exótica vivida na Índia, onde fez a tropa e rapidamente se esqueça de ter sido operado de peito aberto, onde lhe pararam o coração e o mantiveram a uma temperatura não aceitável para gente viva, durante horas.

 

Das duas vezes em que a sua vida foi interrompida, ele acabou por retomá-la da forma mais natural que sabia e todas as suas ações foram no sentido de uma continuidade relativa.

Renascer… dá afinal trabalho e exige demasiado.

 

Não há grandes ilações a tirar sobre este caso, mas ocorre-me dizer que podemos “morrer” várias vezes durante a nossa existência e voltar todas as vezes, com renovada energia, como se fôssemos viver algo novo e tudo passasse a ser diferente dali para frente, mas na verdade nós somos o que somos e vamos manter-nos assim, atravessando todas as interrupções da vida.

 

Teresa Moura (articulista convidada)

 

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3.11.11

 

Passou muito tempo a cuidá-la. Desde aquele dia em que olhou a mãe nos olhos e a soube doente. Todo o seu ser envolveu-se em angústia. Mas não a sua face, de ser tão forte que era. Abraçou-a. Toda a sua infância atravessou-se-lhe aos olhos. Fora tão feliz. E era-o. Graças tanto àquela mãe. Aquela querida mãe.

 

Quando soube, tinha acabado de tirar fotografias ao céu azul. Estava um pouco zangada com os problemas da vida quotidiana. Quando senti a sua voz, o azul tornou-se vivo. Serena tem essa capacidade. Incrível! Parecia como sempre, serena. Reclamei com a vida. Percebi que algo estava diferente. Foi quando a Serena me contou. O céu tornou-se escuro de repente.

 

Serena, era também mãe. Tinha um pequeno ser nos seus braços, e chorava por dentro ao pensar o que seria deixá-lo. Agradeceu à mãe, naquele momento, todo o seu amor e dedicação. Afinal, não era só uma mãe. Era uma confidente, uma amiga, o seu apoio.

Serena, como mulher determinada que era, decidiu que iria apoiar a mãe a ultrapassar aquela dor intensa, aquele medo, que a doença trazia. Por mais que doesse. E cuidou. Todos os dias. Permaneceu entre a esperança e a tristeza. Permaneceu em todas as pequenas coisas da vida. A mãe de Serena era também uma guerreira nata, e por isso, ajudou também Serena nesta caminhada. Porém, Serena, a pouco e pouco, deixou o seu vibrante riso. Sorria apenas. E eu tinha tantas saudades da Serena.

 

Observei-a do longe, que a distância física permite. Via a apagar-se. Via refugiar-se no lar. Com a mãe. Com o filho. Com a família. Compreendi-a, sem nunca conseguir imaginar o que sentia Serena. Porque ao tentar imaginar, a angústia tornava-se insuportável, dolorosa. Serena chorou sempre num refúgio. Todo o seu ser passou a centrar-se na mãe. Felizmente, o pequeno rebento, graças à sua inocência tão abençoada, lançava rasgos nas bocas de todos. Risos. Aquela pequena bênção permitia vida, num ser que definhava aos poucos.

 

Um dia tornou-se óbvio. Estava para breve a despedida. Às vezes tornava-se tão surreal. Para a Serena tornara-se um modo de vida.

O dia chegou. A mãe pediu com os seus olhos a presença de Serena e seus familiares. Todos a olharam com dor, gratidão, amor, carinho, medo, saudade. A mãe apenas sorriu, e partiu. Partiu como um anjo, e como anjo da guarda ficou, daquela querida família.

 

Vi Serena. Estava ausente. Tinha vontade de chorar, mas não podia. Ela mantinha-se inteira, embora quebrada. Foi tão difícil! Conseguem imaginar?! Eu não! Parte da minha Serena morrera com a mãe. Demorou a voltar a soltar uma gargalhada. Teve de se reorganizar. Pelo seu filho também. Queria ser a mãe que tivera. A ausência era demasiado dolorosa. Mas Serena tinha de voltar à vida. Mas, como?

A Vida mostrou-lhe outra face. Nunca mais será a mesma. Já possui o seu riso, as gargalhadas, mas Serena, continua a sofrer muito. Será sempre a Serena, mas há uma parte de Serena que partiu.

Ainda hoje, Serena, procura voltar à vida, a cada dia.

 

(Para a minha querida amiga “Serena”, num dia tão especial, o dia da sua existência – 19 de outubro)

 

Cecília Pinto

 

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31.10.11

 

Há pausas que são deliciosas. Comparo-as à primeira dentada numa pasta de chocolate, quando o meu cérebro começa a assimilar todo o prazer gustativo que esta iguaria está a proporcionar-lhe. Estes primeiros segundos de descoberta do sabor são para mim, inigualáveis. Todo o meu ser fica envolvido neste deleitoso sabor. As dentadas seguintes, por muito apreciadas que sejam, já não superam o impacto que o primeiro contacto ofereceu; o cérebro habitua-se aos poucos ao sabor e cai na rotina dos automatismos. Em contrapartida, os primeiros segundos são uma tomada de consciência do aqui e do agora; neste momento dou toda a minha atenção às minhas papilas gustativas em euforia. Neste instante, não quero saber do telefone a tocar, dos assuntos pendentes, dos problemas para resolver ou das contas para pagar. Neste momento de pausa, só quero estar concentrada em mim, na minha respiração, no meu corpo vivo, nesta bolha de bem-estar que se desenhou à minha volta e que se vai manter enquanto os meus olhos ficarem fechados. Sei que lá fora, do outro lado das minhas pálpebras, o turbilhão continua; mas neste momento, deixo as pressas do lado de lá e fico do lado de cá, a saborear a minha primeira dentada. Inspiro e expiro muito lentamente, observo-me do lado de dentro. Apercebo-me do espaço que existe dentro de mim, não como um vazio, mas sim com um sentimento de amplitude, de abertura de mim mesma. Sinto-me plena e quase pronta a abrir os olhos. Gozo dos últimos segundos desta minha viagem interior, deste surto de vida que surge de dentro de mim. Daqui a instantes vou regressar ao mundo exterior, retemperada. Centrada em mim, desperto novamente e então abro os olhos.

 

Estefânia Sousa

 

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27.10.11

 

Era mais uma das visitas que fazia por altura do Natal, como tantas outras. Sofia, encontrou o seu padrinho combalido mas sorridente, aconchegado no sofá e no calor do cobertor. A sua cabeça careca, que refletia o brilho das luzes natalícias, era estranha. Sim, é verdade que a idade já era avançada e o cabelo ia caindo, mas havia algo de anormal. Animado, o seu padrinho foi desfiando, orgulhosamente, o rol dos últimos acontecimentos e Sofia foi percebendo o quanto havia perdido com a sua ausência: dores de cabeça, mal-estar, idas ao hospital, diagnóstico, operação e recuperação. “Como foi possível? Tudo tão rápido….”. Sofia procurava recuperar do choque das notícias que recebia, ao mesmo tempo que procurava nos olhos do seu padrinho algo que pudesse não estar a ser dito em palavras. Mas tudo o que encontrou foi alegria, muita, pelo sucesso da operação, pelo Natal que passaria com a família, os filhos e os queridos netos. “Estou feliz Sofia, o pior já passou! Dá-me um abraço!”. No caminho de regresso a casa, as emoções ainda à flor da pele turvavam os pensamentos de Sofia. O alívio de que, afinal, estava tudo bem e não passara de um grande susto não era o suficiente para abrandar a tristeza de não ter estado ao seu lado a apoiá-lo, com palavras, com carinho, com a sua presença. “Mas sim, ficou tudo bem e isso é que interessa” – dizia Sofia para com os seus botões na difícil tentativa de encontrar algum reconforto.

 

O Novo Ano chegou. Com ele novas esperanças e projetos e a tristeza de Sofia ia tornando-se mais leve a cada dia que passava. Até que um dia, receou atender uma chamada. O nome que insistia piscar no visor do seu telemóvel era tão raro como preocupante e não augurava nada de bom. Os piores receios de Sofia confirmaram-se e daí foi diretamente para o hospital. Nos olhos do seu padrinho, uns meses antes, havia apenas encontrado alegria sincera. Contudo, o susto tornara-se numa certeza, irremediável e fatal, e a recuperação não passara de uma ilusão. Algumas semanas depois, o homem que visitava religiosamente já não parecia o mesmo que sempre conheceu. Não reconhecia na sua face o carinho dócil dos seus olhos e o sorriso terno de um menino. A doença flagela o corpo mas não se esquece de espezinhar a alma. Numa das últimas visitas, já só o corpo parecia marcar presença naquela cama fria. Em esforço, pediu a Sofia que se aproximasse. A sua voz era já fraca e apesar do grande esforço que fez foi apenas percetível um sussurro: “Sofia, estou a morrer…”. Encurralada entre a vida e a morte, Sofia não sabe se conseguiu conter as lágrimas que inundavam os seus olhos, enquanto lhe afagava a testa quente. Sorriu e disse “Não tenhas medo padrinho, eu estou aqui.”

 

Se é verdade o que dizem sobre os mortos viverem um pouco sempre que os recordamos, hoje trago o meu padrinho de volta à vida.

 

Liliana Jesus

 

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20.10.11

 

A determinação a comandar os passos. Os passos mais rápidos à vista da ponte. À vista do fim. Observa o rio que corre lá em baixo, calmo, silencioso, não fossem os reflexos prateados da lua a denunciar os leves movimento das suas águas e dir-se-ia parado. Ela, sempre turbulenta, é atraída por esta calmaria. Lá em baixo, as águas calmas e prateadas fascinam-na.

Afasta-se do gradeamento, olha em volta. Ninguém! Foi assim toda a sua vida e é assim no seu derradeiro momento de vida. Ninguém!

Tira os sapatos e alinha-os um com o outro. Um saco com o telemóvel e o bilhete de identidade colocado ao lado dos sapatos. O alinhamento dos objetos, num momento destes, é patético de insignificante, mas continua a querer pôr ordem à sua volta.

Sobe para o gradeamento, olha novamente o rio.

Lá em baixo, as águas calmas e prateadas chamam-na. Aproximam-se. Sente a força da gravidade. Luta contra essa força. Quer recuar, sentir novamente os pés em cima da ponte, dominar os seus movimentos. Tarde de mais. Sente frio. Tem medo.

Vê as águas calmas e prateadas abrirem-se. Engolem-na!

 

Deitada no chão. O rio de águas calmas e prateadas ali ao lado. Cabeças debruçam-se sobre o seu corpo, movimentos rápidos sem som, uma luz azul a acender e a apagar. Parece-lhe estar no centro desta agitação. Fecha os olhos.

 

De volta à vida. O renascer é doloroso. Odeia-se pelo insucesso, desilude-se mais uma vez consigo mesma, zanga-se por a terem resgatado. No hospital todos se empenham numa luta para lhe salvar a vida. Uma luta na qual não quer participar. Os profissionais da saúde trocam olhares, de preocupação umas vezes, de esperança, outras. Zelam, observam, cuidam dela. Não desistiremos, garante-lhe uma enfermeira. Sente-se acarinhada. Rende-se.

Os outros doentes olham-na como se fosse diferente, comentam o seu caso, “quis pôr termo à vida”. Enganam-se. Ela também se enganou. Não se pode acabar com a vida onde ela não existe. Não quis acabar com a vida, quis acabar com a morte que havia dentro dela. Enganou-se quando pensou que a vida se esgotava nas contrariedades, nas angústias e tristezas que tantas vezes a assaltavam, ou na solidão que se lhe impunha. Enganou-se quando optou, obsessivamente, por se magoar mortalmente. Não se recorda de alguma vez se ter esquecido de si e ter olhado à sua volta. Nunca cativou ninguém, não conheceu a gratidão, o amor, a amizade.

Interiormente, tem muito trabalho para fazer e, quer fazer, porque não lhe salvaram partes do corpo - salvaram-lhe a vida.

 

Cidália Carvalho

 

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13.10.11

 

Para os mais distraídos e para que não haja dúvidas, o melhor é dizê-lo de uma só vez: vamos todos morrer! É uma das maiores certezas desta vida e também uma das mais democráticas: toca a todos por igual e não contempla exceções.

Provoca algum transtorno, sim. Mas é inevitável, principalmente no fim da vida.

Já decorreram milhares de anos desde que começou a morrer gente e continuamos a saber muito pouco sobre este fenómeno. É como se fosse um departamento do conhecimento universal vedado ao Homem, um espaço de sabedoria sem janelas, um lugar de acesso altamente restrito.

Entender a morte parece-me, no entanto, mais simples que entender a vida, até porque é mais fácil falar daquilo que julgamos estar distante de nós. E tal como percebemos melhor o frio se experimentarmos o calor, talvez encontremos o sentido da vida se nos aproximarmos da morte.

Plagiando uma ilustre conhecida dos nossos tempos, "estar vivo é o contrário de estar morto". A vida deve ser, em teoria, tudo aquilo que a morte não é. Assume-se que a vida e a morte ocupam pólos opostos, entretanto, são as duas faces da mesma moeda.

Há pessoas que estão vivas mas não se nota nada. Outras, porém, que já morreram há muito mas ainda se fazem presentes.

Não sei o que é estar morto, logo, também não sei o que é estar vivo. Só sei que a vida se compõe por muitas mortes, como se todos os dias fossemos morrendo um pouco mais. Nascemos, crescemos, tornamo-nos autónomos e às tantas traçamos para nós um plano, uma rota, uma série de caminhos que queremos trilhar: ser saudável, estabilizar as contas, constituir família, envelhecer em paz, por aí fora. Mas não há caminhos sem obstáculos. Uns maiores que outros.

Viver é seguir caminho. A cada obstáculo deixamo-nos morrer. Vamo-nos aproximando gradativamente da morte final através de experiências menores de morte: quanto de nós morre quando parte algum dos nossos? Quanto vivos ficamos depois de um desastre amoroso? Quantas vezes morre uma mãe até que o filho se endireite?

Viver é seguir caminho, de novo. De cada vez que recuperamos de uma dificuldade, a vida continua. Mas entretanto a vida ficou adiada.

Gostaria de perceber qual é a utilidade da morte. De que me serve a finitude? Ter essa espada sempre por cima da cabeça cansa e não me traz qualquer vantagem. Pior: para que me serve ir morrendo aos poucos se posso fazê-lo de uma só vez?

Este procedimento padrão de morrer sempre que se vive é muito estranho. Faz-me pensar que se vamos morrer, então mais vale não me dar ao trabalho de viver. Mas aí começo a equacionar as desvantagens de morrer, que devem corresponder às vantagens de viver, e concluo que ainda não me apetece falecer.

Afirmar que os obstáculos fazem parte da vida parece-me poético. Os obstáculos fazem é parte da morte. Para viver temos que estar sempre a contornar, a enganar e a fugir à morte. Voltamos à vida tantas vezes quantas as vezes que morremos, e o mais certo é essa nova vida ser diferente da anterior.

Em função desta definição é provável que encontremos mais gente morta que viva, porque quase ninguém escapa aos obstáculos. Os conceitos de vida e de morte podem afinal não ser tão opostos quanto se julga. Estar vivo pode não ser o contrário de estar morto. Pode a morte ter sentido se não incidir sobre a vida? Então a vida só fará sentido se for vivida em função da morte, nos momentos em que nos autorizamos a escapar-lhe.

 

Joel Cunha

 

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10.10.11

 

Luís já cumprira seis anos da pena a que fora condenado. Esteve todo aquele tempo no mesmo estabelecimento prisional, na mesma cela. Os seus companheiros de cela foram mudando. E houve mais mudanças, algumas que o Luís observou, outras, lá fora, que nem consegue imaginar. Ia ter agora a sua primeira saída, o seu primeiro fim de semana a tocar a liberdade, dois dias entre pessoas que não fazem parte do seu mundo atual.

Nos primeiros três meses de prisão recebeu algumas visitas, do irmão e de um amigo de infância. Subitamente, desapareceram e não teve mais notícias nem visitas. Revoltou-se, culpou-se, resignou-se e habituou-se ao seu novo mundo, um mundo diferente, um mundo bem pequeno, com poucas caras.

A reeducadora não conseguiu encontrar o irmão, único familiar que conseguia referenciar. Para sair, tinha de ter uma referência, tinha de ter onde ficar. Mas quem referenciar? Mas onde ficar? Nos últimos seis anos só tivera os seus companheiros de cárcere e o pessoal prisional, só conhecera aquela cama dura onde deixava o cansaço da longa espera e a angústia da vida interrompida. A sua solidão, o seu isolamento, o seu abandono, pareciam querer contrariar todo o esforço de bom comportamento. Mais uma vez a reeducadora deu uma ajuda e conseguiu uma vaga n’A União. Estava tudo combinado: o Luís ficaria num quarto durante a sua saída.

No Luís, a ansiedade e a confusão debatiam-se. Tudo lhe parecia novo. O sorriso do guarda, sair o portão, ter dinheiro no bolso, entrar num autocarro, dirigir-se a um destino, com um papel na mão com uma morada escrita. Os carros, como estavam diferentes... mais redondos, mais coloridos. E as pessoas… as roupas eram diferentes.

N’A União mostraram-lhe o quarto. Era simples, mas parecia-lhe cheio de coisas e de conforto. Luís estremeceu de surpresa quando lhe entregaram a chave do quarto. Há tanto tempo que não pegava uma chave… Procurou na memória um momento como aquele, em que guardava uma chave que era sua, na algibeira; já não consegui encontrar.

Luís tinha fome. Sentiu vontade de, ao fim de seis anos, comer sozinho, longe da presença de outras pessoas. Saiu à rua procurou uma loja onde pudesse comprar comida para levar para o quarto. Encontrou um supermercado e entrou. Espantou-se com cada expositor, com cada prateleira, demorou-se a contemplar e a analisar cada artigo. Encontrou coisas que já não recordava existirem, de que há muito deixara de necessitar. Ficou ansioso por ter de escolher, mas escolheu, com brilho nos olhos e alegria no coração por de novo poder fazer as pequenas e quase inocentes escolhas do dia a dia.

De regresso ao quarto, experimentou deliciado um jantar a sós consigo mesmo, escolhido por si. Esticou-se na cama, fechou os olhos e sorriu. Não lhe pesava o passado. Ainda não lhe pesava o futuro. Sentiu a chave cair-lhe do bolso, para o colchão e o baixo ruído metálico rodopiou na sua cabeça. Sorriu. Percebeu que voltava à vida. Como mais ninguém, naqueles momentos, compreendeu os sinais de vida que, subtis e despercebidos, há em cada gesto, em cada objeto. Pouco depois adormecia, embalado pelo calor das suas descobertas. Dormiu o sono dos justos.

 

Fernando Couto

 

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6.10.11

 

Como qualquer ser vivo, me intriga a morte. O que acontece depois? É verdade que voltamos, ou talvez não, se o nosso comportamento não estiver de acordo com o esperado? É verdade que voltamos na mesma família, com os mesmos amigos, até superar diferenças?

Não tenho a menor ideia do que acontece. Nunca tive nenhum tipo de experiência, dessas que a pessoa vê um túnel e sai em direção a ele.

O que me atormenta é o que dizem. Nós só levamos o que vivemos, mais nada. Não temos como levar nem um pouco do perfume que mais gostamos. Penso muito nisso, porque como muita gente estou despreparada. Já me falaram que rola um julgamento, onde não existe argumento, você é obrigado a assistir toda a tua vida e será julgado pelas coisas que não fez, não pelas que fez. Também me falaram que o filme da vida é dividido em duas partes. A primeira parte são as coisas ruins, pode levar eternidades para assistir e ver como você lidava com isso e a outra parte, muito rápida, são os momentos bons, felizes, plenos, essa parte dura segundos e isso determina que tanto você aprendeu na vida.

Me sinto despreparada porque não fiz até agora as coisas como deveriam ter sido feitas. Desde que nasci me perdi em problemas de peso, dietas malucas e ideias imbecis sobre o que é bonito ou não. Tenho doutorado nisso, em mutilação, tortura, fome, remédios para emagrecer e milhões de coisas picaretas. Sei tudo isso de cor, posso em segundos falar quantas calorias existem em milhões de coisas. Mas não vou levar o meu corpo ou seja, todo esse trabalho, toda essa dor, no fim não me servirá de nada. Trinta anos jogados no lixo e ainda desconfio que alguém lá em cima vai me dar uma bronca. E não sei se dá para juntar segundos de felicidade, para a segunda parte do filme. Isso também me atormenta. Sempre fui boa aluna aqui, não sei como será chegar lá e ficar ouvindo um monte. Minha única defesa é que eu não fui avisada. Ninguém me disse que os padrões estéticos do mundo não são reais, nem que a felicidade era uma coisa simples, nem que sentimentos ruins tem que ser domesticados, controlados e isolados, como doenças contagiosas.  Ninguém me avisou que eu poderia ser feliz sem muitas ambições, só seguindo o que eu quero, não o que me dizem para seguir. Ninguém me disse que minha vida ou a de qualquer um, poderia ser harmoniosa como a de uma borboleta, respeitando os ciclos e voando só por um motivo, não por milhões deles.

Espero ter tempo de reverter isso, mudar o filme, editar as partes ruins e colocar mais boas . Espero ter tempo de agradecer meu corpo por tudo de bom que ele fez e por todas as torturas que ele suportou em silêncio. Espero ter tempo, gostaria de chegar lá e saber que ninguém me avisou como era a vida aqui, mas ainda assim eu soube viver. Gostaria de pensar isso, talvez já morri um dia, mas agora estou de volta à vida.

 

Iara De Dupont (articulista convidada)

 

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3.10.11

 

Quem estiver interessado no tema (desconfio se não tiver uma costela masoquista), encontrará de certeza na Internet textos e textos de conselhos para um retorno são às funções laborais. Eu com certeza não o fiz, nem o farei. Já explicarei porquê. Repare o leitor que utilizei o termo “são” mas poderia ter utilizado um termo que não se envolvesse na dicotomia ausência de doença – doença, ou até não ter utilizado um termo adicional de todo. Fi-lo propositadamente porque a minha experiência me diz que no início de setembro, quando por coincidência terminam as minhas férias, tenho uma “tendência” natural para ficar doente. Logo, não são. É evidente que quando fico doente, não remeto esta condição para a parte física da coisa. Se tanto, primeiro fico doente psicologicamente e tal, como consequência, leva-me inevitavelmente para a questão meramente física. Antes se tratasse de uma gripe apenas que em 3 dias estava resolvido...

 

É evidente que tenho as minhas estratégias que visam minorar o impacto da transição praia / cama / horários livres / família, para escritório / secretária / horários rígidos / chefe. Aconselho todos a fazerem o mesmo. Dai não ter ido à Internet procurar qualquer tipo de informação. Tenho uma “receita caseira” que me vai mais ou menos servindo e que se vai transmutando de ano para ano. Não sei se por uma questão de idade (minha) ou idade das minhas funções no local. Vou partilhar a receita deste ano, mas não a tentem replicar dado que não se garantem resultados e que a mesma poderá sofrer alterações, sem aviso prévio, para a próxima temporada.

 

1 – No primeiro dia de férias interiorizo o facto de que as mesmas terminarão brevemente;

2 – No primeiro dia de férias continuo a interiorizar o facto de que ganhar o euromilhões envolve probabilidades que não estão ao alcance da minha matemática, pelo que levar o resto da minha existência sem trabalhar mais, provavelmente não irá acontecer agora;

3 – No primeiro dia de férias dou graças ao facto de poder passar tempo com a família sem estar preocupado com horários de trabalho ou escolas. É claro que também interiorizo o facto que tal tem uma duração limitada, mas que é melhor “curtir” o momento do que estar a sofrer pelo seu término;

4 – No primeiro dia de férias decido que mesmo que caiam o Carmo e a Trindade, não vou gastar 2 minutos a pensar no que ficou por fazer no trabalho;

5 – No primeiro dia de férias inicia-se a tradição de (excepto em caso de indiscutível necessidade, evidentemente) não contactar nenhum colega de trabalho. Eles sabem que não podem levar a mal, dado que passo com eles 11 maravilhosos meses de companhia;

6 – No primeiro dia de férias decido que só voltarei a pensar em voltar à vida de trabalho no último dia de férias;

7 – No último dia de férias deito-me tarde, por forma a adormecer de tão estourado que não me permito dar voltas à cama a fazer contas – “faltam 7 horas para ir trabalhar”, “agora faltam 6”, “porreiro, 5 horas”, “será que vale a pena dormir por 4?” e geralmente acabava por aqui e dormia 3;

8 – No primeiro dia de trabalho não inicio nenhuma tarefa complicada. Acho mais simpático rematar pontas soltas de atividades do ano anterior e esperar que tal dure mais um ou dois dias, antes de oficialmente na minha cabeça iniciar um novo ciclo;

9 – No primeiro dia de trabalho interiorizo o facto de que se não fosse pelo meu emprego não conseguiria fazer e ter as coisas que faço e tenho quando saio do mesmo;

10 – No primeiro dia de trabalho não olho sequer para o calendário de atividades do ano. Se me perguntarem quando é o próximo feriado, dou-vos um exemplo: soube hoje, domingo, que vai ser na próxima quarta.

 

E pronto, aqui ficam 10 ingredientes da minha receita. Com certeza até serão mais mas na verdade não consigo pensar de momento nos outros, dado que após o ter escrito, de facto ainda não consegui interiorizar o ponto 2.

 

Rui Duarte

 

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16.6.11

 

O desejo de significado é intrínseco ao ser humano. A crença de que as nossas acções, opiniões, ideias e, alargando a escala, a nossa vida é importante, tem sentido e faz a diferença é a alavanca que nos move no dia-a-dia e uma preocupação visível nas muitas ciências. Por exemplo na tela considerada como a "derradeira expressão da força artística" de Paul Gauguin intitulada “De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?” datada de 1897, exposta no Museu de Belas-Artes de Boston pintada muito próximo da morte do pintor e que apresenta o trajecto da vida humana desde o nascimento até à velhice.

Todos conhecemos estas grandes perguntas que, de quando em vez, nos colocamos e dificilmente encontramos uma resposta satisfatória. Ninguém pode negar os avanços científicos e as grandes conquistas a vários níveis e, no entanto, parece que permanecemos na escuridão, na penumbra quanto a estas questões essenciais.

 

A grande maioria pode viver em função ou da sua família, ou de conhecer o mundo e, portanto viajar, ou de se envolver em quaisquer outros interesses pessoais por considerarem que esse será o seu objectivo de vida e aí encontrarem o seu sentido de viver. Outros há que se dedicam a causas humanitárias, ou à investigação científica, ou às artes. O importante parece ser sentir que há significado e sentido em alguma coisa. Albert Einstein disse, certa vez: "O homem que acha que a sua vida não tem sentido não é apenas infeliz, mas também muito mal preparado para a vida."

Mesmo assim, em certas alturas, o vazio pode permanecer. A pergunta continua sem resposta: A vida tem sentido? Esses momentos são normalmente momentos de viragem, momentos difíceis e de grande provação. Por exemplo, quando um pai ou mãe vê um filho morrer de uma doença incurável pergunta-se porquê esse sofrimento? Há algum sentido nisso? Perguntas assim continuam a intrigar muitos de nós que observamos as actuais condições do mundo - as doenças, o sofrimento, a fome, as injustiças. Tudo parece mais fácil e aceitável quando não há obstáculos e provas a superar. Todos nós gostaríamos de saber qual o sentido destes acontecimentos. 

Mas continuamos a percorrer o nosso próprio caminho e na nossa procura, seja através da filosofia, da religião ou outra qualquer via, depositamos a nossa esperança ou fé de encontrar a resposta.

 

Viktor Emil Frankl (1905-1997) médico e psiquiatraaustríaco afirma no seu livro “Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração” Petrópolis: Editora Vozes, 1991, “não há dúvida de que o amor-próprio, quando ancorado em áreas mais profundas, espirituais, não pode ser abalado por uma situação de tremendo sofrimento”. E mais: “Ouso dizer que nada no mundo contribui tão efectivamente para a sobrevivência, mesmo nas piores condições, como saber que a nossa vida tem um sentido.” Uma vida com sentido – isso é que dá verdadeiro sentido à vida.

O sentido da vida também pode estar associado a sentimentos de harmonia e felicidade; sem a felicidade a vida parece perder sentido. A felicidade está no centro das nossas vidas e da nossa procura de sentido para a vida.

“Não sei se o Universo, com as suas inumeráveis galáxias, estrelas e planetas, tem algum sentido mais profundo, mas é muito claro que nós, humanos que vivemos nesta Terra, temos como objectivo, a procura de uma vida feliz.” Dalai Lama

Ou então, tal como disse Joseph Campbell (1904-1987) estudioso americano: ”Dizem que o que procuramos é um sentido para a vida. Penso que o que procuramos são experiências que fazem sentirmo-nos vivos.” Sim, experiências que fazem sentirmo-nos vivos!

Acredito que há, de facto, algo que nos transcende, uma energia vital presente na natureza, em nós, que parece ser eterna. Partilho da opinião de Campbell quando diz que devemos começar por experimentar o eterno, no agora, no presente, e para isso precisamos de estar atentos e de o procurarmos com empenho dentro de nós.

 

Ana Teixeira

 

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6.6.11

 

Jeremias nasceu no campo, numa aldeia. Brincou o mais que pode nas terras, nas árvores, no rio da sua aldeia e, nas horas vagas, frequentou a escola com todos os meninos e meninas com os quais tinha nascido. Depois teve de mudar de escola, para uma maior que ficava na cidade mais próxima. E depois mudou-se para uma cidade ainda maior, com muitas escolas, ainda maiores. E quando chegou à idade de trabalhar, lá conseguiu emprego e por ali ficou, longe da sua aldeia.

Quis ganhar mais dinheiro e ter novas experiências e então partiu para outro continente. Quando se cansou, voltou à cidade grande.

Desde que deixou a sua aldeia, procurou um sentido para si, para a sua existência, para a sua vida. Pensou muito nisso e mais procurou. Se o colocaram aqui, fora certamente para alguma coisa. E como ninguém lhe pediu vontade ou opinião, quem o colocou teria certamente uma ideia, um sentido para a sua vida. Mas quem o colocou aqui? E qual a ideia que tinha para ele? Como conseguiria ele descobrir esse sentido que alguém lhe deu, mas não o informou?

Ao longo do tempo alegrou-se por diversas vezes quando sentiu ter descoberto o tal sentido. Mas todas essas descobertas acabaram por revelar sentidos proibidos, sentidos únicos e sem retorno, becos sem saída, caminhos sem qualquer sentido.

Mas Jeremias lá foi andando, fazendo a sua vida dia-a-dia, como quase todas as pessoas.

 

Quando já estava velho, concluiu que a sua vida fora gasta a tentar encontrar o sentido, o tal que alguém definira para ele. E só pôde tirar uma conclusão: a vida não tem sentido; se tivesse sentido, tê-lo-ia certamente encontrado. E ficou com uma tremenda angústia – o que perdeu ao longo da sua vida enquanto procurava um sentido para ela? Mas já era tarde…

 

Fernando Couto

 

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2.6.11

 

É próprio da condição humana encontrar sentido em tudo o que se faz. Para além disso, e como reforço, somos maioritariamente educados nesse sentido, ou seja, que fazer algo sem sentido, não faz sentido nenhum. Assim, a vida, tal como todas as outras coisas que são finitas (na nossa vida), carece também ela própria de sentido. Porém, contrariamente a muitas outras interrogações que têm todo o sentido de serem feitas, esta apresenta-se assustadoramente próxima de indefinição conclusiva. Claro que existe quem advogue uma resposta a esta perturbadora inquisição - mesmo que por vezes a iluminada declaração não faça qualquer sentido...

Penso ter a concordância de todos quando afirmo que ninguém sabe qual é, inequivocamente, o sentido da vida (enquanto interrogação existencialista, universal e transversal), mas que todos os que alguma vez se questionaram (ou foram questionados) sobre o assunto têm (ou tiveram) forçosamente uma opinião. Mesmo os que remetem esta desumanamente angustiante interrogação à insignificância cognitiva e emocional respondendo com um “sei lá”, “não faço ideia”, “não me interessa”, ou “quero lá saber”, estão no fundo a vocalizar um mudo “para mim não importa encontrar sentido na vida, porque não é fundamental fazê-lo para continuar a viver a minha vida como o fiz até aqui e como vou fazê-lo de futuro. Logo, não existe sentido na vida porque para mim ela sempre existiu e continuará a existir. Não preciso de sentido para viver”.

Contudo, experimentando questionar o sentido biológico da vida, facilmente chegamos a respostas. Do nascimento à morte, é sempre sentido único. Se experimentarmos questionar o sentido profissional da vida, também chegaremos (mais dificilmente é certo) a respostas. Do primeiro emprego à reforma, é sempre sentido único. Se experimentarmos questionar o sentido religioso da vida, também chegaremos (muito, mas muito mais dificilmente) a respostas. Da rectidão à recompensa, é sempre sentido único. E continuamos por ai fora, mesmo ao ponto mais redutor: do nada ao nada, é sempre sentido único.

 

Faz então algum sentido procurar sentido na vida? Da forma como foi apresentado este tema acho eu que não. Acho que faz sentido trocar a palavra “sentido” por “objectivo” e mudar a questão para “o objectivo da vida”. Porque, qualquer que seja a abordagem a ter, biológica, profissional, religiosa ou mesmo a do “nada” remete-nos para um “closure”, um “descer do pano”. Faz então sentido termos objectivo (s) na vida? Agora sim, faz todo o sentido. Faz então sentido procurarmos noutros o sentido da nossa vida? Faz, se estivermos desorientados. Porque a mim me convém, a isso chama-se psicoterapia.

        

Rui Duarte

 

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30.5.11

 

Em jeito de provocação, abrindo hostilidades, direi que, como é óbvio, a vida não tem qualquer sentido. Ou melhor, tem todos. Eu explico: que sentido existe na afirmação de que a vida terá um, nenhum ou todos os sentidos? Que é que isso importa? A vida é para ser vivida, nada mais. E isto não é discutível, porque enquanto durar a discussão, nem o tempo espera nem a vida melhora. A menos que esse sentido seja a razão, o caminho, a estrela que norteia a vida daquele para quem a vida tem um sentido.

Por todas as razões e mais algumas, cada criança que nasce devia fazer-se acompanhar de um manual de instruções. No capítulo das advertências constaria, em letras garrafais, qualquer coisa como: Cuidado! Este artigo pode tornar-se autónomo. E no das funcionalidades algo do tipo: Está programado para perseguir incansavelmente a satisfação das suas necessidades. E isto, autonomia na satisfação das necessidades, é afinal o grande e único, se existir, sentido da vida. É indefinível mas toda a gente sabe qual é o seu. Ou tem, pelo menos, uma vaga ideia. Varia com a urgência do momento e com as estratégias escolhidas para extinguir a carência.

O sentido da vida é o resultado de uma equação complexa na qual concorre um vasto e denso conjunto de variáveis do indivíduo e um maior e mais maciço conjunto de variáveis do meio. Essa equação é para ser resolvida ao longo da vida, pelo que, se as contas estiverem bem-feitas, encontrar-se-á o sentido da vida bem perto da morte. E aí, obrigado, mas já não preciso.

 

O sentido da vida é mais uma imbecilidade a juntar a todas as ilusões que alimentam a esperança de virmos a ter num futuro uma vida melhor, mais cheia, mais rica, mais saudável, mais qualquer coisa que nos encha de felicidade e alegria. Entra naquele leque de frases e palavras parvas que, no fim de contas, assume o significado que cada um lhe quiser atribuir. Falar de sentido da vida obriga a falar de escolhas, de decisões. Ou então de destinos ou fados. Cada um escolhe o seu ou está condenado a ter um, em função das suas crenças, convicções e influências. Se houver sentido na vida ele só fará sentido para aquele que o quiser ter. Doutra forma não passa de um vazio gelado.

- Ah e tal, mas a vida não fará sentido se não tiver um rumo!

Muito bem, nada contra o rumo. A vida deve ser levada com conta e medida. Pode até fazer-se e seguir-se um projecto de vida. Pode mesmo encaixar-se a vida nuns carris e acompanhar a linha com o mínimo de descarrilamentos. Pode fazer-se isso tudo, com mais ou menos disciplina, mas no fim pouco ou nada diremos acerca do sentido que tudo isso fez, porque, tal como a variedade de paisagens que o comboio atravessa, também a vida coleccionará todos os sentidos que for assumindo ao longo do percurso, do tempo, das idades, dos momentos, das efemérides, dos episódios, das necessidades, das vontades, de todas as estações e apeadeiros por onde passar.

- Ah e tal, e o sentimento, o amor, a felicidade e todas as coisas boas que dão sentido à vida?

Não sejas parvo!

 

Joel Cunha

 

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26.5.11

 

Numa dimensão cósmica, sei que a minha existência tem uma razão de ser, embora não seja capaz de a perspectivar em toda a sua dimensão, na medida em que o meu campo de visão é apenas humano. Percebo somente que sou parte integrante de um sistema universal e que tenho uma missão a cumprir. Se me conseguir dedicar plenamente a esta tarefa, será a obra de uma vida.

Na minha perspectiva, o que dá sentido à minha vida são todos os pequenos momentos que constituem o meu dia-a-dia. Para mim é importante viver o momento presente, tirar partido deste momento. Se for um momento feliz quero sentir prazer em vivê-lo, numa circunstância infeliz será um desafio que tenho pela frente. Sei que sou um ser único e complexo, como cada um de nós, e como tal devo conhecê-lo e explorá-lo o máximo que puder, visto que esta é uma oportunidade única. Apesar dos mais diversos sofrimentos que a vida possa trazer, gosto do modo como encaro a minha vida, sinto-me bem com a forma como a vivo e, implicitamente, esta é a moeda de troca que encontro para agradecer tudo o que a vida me dá. Tive a sorte de ter nascido onde nasci e quando nasci, livre de ser quem sou… podia ter nascido no Paquistão ou na Somália, penso que em ambos os casos, neste momento, teria boas razões de queixa. Se tivesse nascido há cinquenta ou cem anos atrás, provavelmente não usufruiria um terço do conforto com que vivo actualmente; o que não impede de ouvir muitas histórias felizes dessa época...

 

Considero que é importante pensarmos duas vezes antes de nos queixarmos. É verdade que as injustiças existem e sempre existiram, não apenas na nossa rua, no nosso quarteirão ou no nosso país. Se este mundo fosse justo, não teriam já morrido à fome várias dezenas de pessoas (adultos e crianças), desde o momento em que comecei a escrever este texto. Esta é uma realidade crua que conhecemos, reconhecemos, mas que acaba por não nos afectar porque não incide no nosso dia-a-dia, simplesmente temos a sorte de nem sabermos verdadeiramente que realidade é essa. Obviamente não podemos mudar o mundo, mas podemos fazer a nossa parte, aquela que está ao nosso alcance, e que começa por dar à nossa vida o sentido que ela merece.

No país e na época em que vivo, na sociedade em que estou inserida, correndo o risco de destoar das correntes actuais, faço questão de hoje usufruir da minha liberdade e escrever publicamente que sou feliz aqui, no país onde vivo. Ultimamente, os meus hábitos podem ter mudado, os meus orçamentos reavaliados, mas não é por isso que o sentido que dou à minha vida se denegriu. Agora, mais do que nunca, tenho consciência do que é realmente importante e tenho vontade de lutar e trabalhar, agarrar-me à vida e às oportunidades que ela me oferece.

 

Estefânia Sousa

 

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23.5.11

 

Sentou-se no sofá. Ainda tremia. Tudo parecia desmoronar. Maria não podia acreditar nas palavras do médico. Aquela doença. Ainda latejavam as palavras no seu cérebro: ”Senhora Maria, lamento informar, mas o tumor encontrado é maligno. A Senhora Maria tem cancro”. A partir dali deixara de ouvir. Fixara-se na sentença que o médico proferira.

- “Cancro???” – repetia aterrorizada. Como podia estar a acontecer-lhe a ela, que até tinha uma vida saudável.

- “Vou morrer” – desabafaram as lágrimas pelo seu rosto.

 

Maria fora sempre uma mulher enérgica. Tinha uma família da qual se orgulhava e a fazia sentir amada. Era realizada profissionalmente, adorava o que fazia. Maria, era uma pessoa contente com a sua vida. Sempre tudo tivera um rumo.

Após a faculdade, tinha arranjado trabalho na área. Conhecia já Francisco e pouco tempo depois acabariam por se casar, numa cerimónia magnífica, tal como ambos sonharam. Daí para frente a rotina tornou-se um clássico, mas ambos sempre gostaram de desafios e novos projectos, e por isso não tardou a terem filhos e sentirem-se abençoados pela vida. A vida que, num contratempo ou outro, os habituara a sorrir. Não era comum questionar a existência ou até o sentido da vida, já que sempre o destino se encarregara de lhe traçar bons trilhos. Viviam numa espécie de véu que os fazia sentir protegidos, com sentido, como se tudo se encaixasse perfeitamente.

 

Caíra como uma pedra num charco aquela notícia. Francisco nada sabia sobre a doença oncológica de Maria. Maria não queria preocupá-lo com algo que poderia ser nada. Quando ouviu o som metálico da chave na fechadura, Maria estremeceu.

- “E agora?” – pensava. “Como lhe vou dizer que vou morrer?”.

Francisco entrou. Como sempre, fez os gestos do costume, mergulhado no seu automatismo.

- “Amor, cheguei” – anunciou.

Maria manteve-se intacta. Francisco estranhou. Subitamente pressentiu algo.

- “Maria, está tudo bem?” – perguntou preocupado.

A face de Maria tinha as marcas das lágrimas escorridas.

- “Meu amor, que se passou?” – insistiu Francisco.

- “Tenho Cancro” – respondeu secamente Maria.

Francisco estarreceu. Sentiu-se quebrar. “Não faz sentido!! Cancro?”. O mundo desabara. Imediatamente Francisco pensou na morte. Abraçou a sua mulher. Maria em prantos gritava “Vou morrer, vou morrer!!”.

A noite chegara. Estavam ambos deitados na cama sem conseguir deixar de fixar o tecto. Maria sentia-se confusa. Estava amedrontada com a ideia que tudo poderia acabar. Nunca pensara propriamente na possibilidade de morrer assim. Sempre tivera uma vida sem dissabores. Nada daquilo fazia sentido para si. Como era possível, de um momento para o outro, tudo acabar? Simplesmente não fazia sentido. Porquê a ela? Porquê agora? Que sentido tinha ter vivido uma vida de sonho para agora acabar de uma maneira tão terrível? Que sentido tinha a vida afinal?

 

Levantou a cabeça cansada. Estava nauseada. Aquele ciclo tinha sido mais desgastante. Sentia-se fraca. Mas sabia que era normal. Dirigiu-se à cozinha para beber um gole de água. Sabia que Francisco estava a chegar. Queria muito estar no seu colo, com o amor da sua vida. Os braços de Francisco confortavam-lhe a alma e davam-lhe ânimo para combater o Cancro.

Algumas semanas tinham passado desde o choque da notícia. Maria começara a tentar viver um dia de cada vez, como tanto lhe diziam no hospital quando fazia os tratamentos. De certa forma, Maria estava mais desperta para a vida. Para os pormenores. Para quem estava a seu lado. Houve tempos em que nada fazia nexo. Após se confrontar com a morte, com o medo, após discutir com o universo, Maria começara a aprender a sua condição humana, a sua fragilidade. Aceitara o que o destino lhe colocara no caminho. Mas não se conformava em desistir. Francisco não deixaria.

Era como os passarinhos que todos os dias a acordavam. Nascera, crescera, dera à luz, e agora estava na luta pela vida que, um dia, naturalmente, acabaria. Como a de qualquer ser vivo. Maria, percebera que o sentido da vida era ter sentido. Um sentido seu. Percebeu que uma pessoa sem sentido já estava morta, mesmo que organicamente viva. Mas muita vida existia dentro de Maria. Tinha vontade de viver. Viver cada minuto que ainda tinha. Se um dia, por uma questão genética, ganhara vida por puro acaso, não pretendia desperdiçar nem um minuto dessa vida, que inevitavelmente, num certo minuto acabaria por findar. Assim, sem mais nem menos.

 

Cecília Pinto

 

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19.5.11

 

O sentido da vida descobre-se nos momentos em que o coração quase pára. Breves segundos em que, após a batalha, se instala o silêncio que nos grita na alma, e tudo parece claro como água. “Dá-me tempo. Mais tempo. Mais vida.” Todavia, antes de avançar, há que dar sentido ao que ficou para trás.

Parar e olhar para trás é fazer um ponto da situação antes da caminhada em frente. É perceber que a vida tem de ser mais do que sobreviver, sob pena de se permanecer em estado bélico, o resto da existência. Sobrevive-se à violência física e psicológica. Sobrevive-se ao abuso camuflado e massacrante. Sobrevive-se ao terror da chantagem emocional. Sobrevive-se a doenças terríveis e dissimuladas, com nomes impronunciáveis. Sobrevive-se à falta de dinheiro, aos gritos, à dor. Sobrevive-se com mazelas, no corpo e na alma, mas sobrevive-se. Até ao dia em que cansa, apenas, sobreviver. Em que impera a necessidade de desmantelar as armas e deixar de temer sempre o pior. Em que urge assistir ao romper da aurora com alegria na alma, e esperança de que, a felicidade, seja o bálsamo de todas as dores. De batalha em batalha, pomo-nos à prova: cada vez que pensamos não poder mais, descobrimos que, afinal, ainda podemos. A força que vem de dentro parece crescer na mesma proporção do desafio. Podemos usá-la ou não… Podemos renunciar. Podemos baixar os braços e, simplesmente, desistir. Cansa lutar. Sem um sentido para as coisas, deixa de ter importância resgatar o dia seguinte. Se a vida, entretanto, nos ceifou a alma, o que caminha de nós é um invólucro vazio e putrefacto que, não sabendo para onde vai, qualquer caminho lhe serve. Segue ao acaso, alheio ao Sol que nasce todas as manhãs, alheio aos sorrisos e às maravilhas do mundo. Um pé atrás do outro. Sem directrizes.

 

Às vezes, no entanto, sem explicação racional, da maior das dores, emerge uma vontade incontrolável de viver em plenitude. De exorcizar esse sofrimento amando, sorrindo, abraçando, partilhando, cuidando; mesmo sabendo que não se foge ao inferno, ele passa é a viver dentro de nós. E, cada dia, se torna uma conquista que, de tão dura e acutilante, sabe mesmo bem vencer. Dizia Ortega y Gasset, “Eu sou eu e as minhas circunstâncias”. As circunstâncias, raramente as escolhemos, mas podemos escolher a forma como as encaramos, como reagimos a elas. O sentido da vida é muito mais do que um conceito estéril e filosófico. É a bússola orientadora. É a razão de todas as coisas. É o que nos salva da loucura quando a força nos falta. Perceber o sentido da vida é como ter livro de instruções, ainda que com algumas folhas em branco e páginas encriptadas.

 

Alexandra Vaz

 

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16.5.11

 

As crianças desconhecem-na, ingenuamente, por não terem consciência plena da condição humana. Os adolescentes ignoram-na, embriagados pela protecção ilusória que a juventude lhes proporciona. Os adultos vão-se vendo obrigados a ir lidando com ela sempre que os seus efeitos tropeçam nas suas vidas. E os idosos aprendem a ir aceitando, dia após dia, a sua inevitabilidade mais ou menos próxima. A morte é uma certeza cruel, fria, uma verdade que encerra um silêncio ensurdecedoramente infinito e que nos acompanha, sempre, ainda que a tentemos esconder, ainda que a tentemos atropelar com o ritmo frenético das nossas rotinas quotidianas. Como perceber, então, como aceitar, que seja esta mesma morte anunciada que garante a beleza única e singular à vida humana e que nos recorda, todos os dias, o privilégio que temos em acordar e em estar vivos?

 

A morte e a sua natureza fatalista provocam no Homem um desequilíbrio constante que deriva da angústia de se conhecer o seu fim inevitável e nada poder fazer para o alterar ou evitar. Mas se o Início já faz parte do nosso passado, quando dele tomamos consciência, e o Final espera-nos irremediavelmente, caberá a cada um nós, enquanto indivíduos, definir e escolher aquele que será o seu “Durante”. Mais do que descobrir o sentido da vida como se de um segredo guarado a sete chaves se tratasse, talvez o Homem deva concentrar-se no caminho que decide ir desenhando na calçada do seu trajecto de vida. Um caminho que assuma sem reservas a tragédia da própria condição humana e que, com a mesma determinação e coragem, consiga reconhecer ao Amor, à Alegria e às emoções positivas, o poder de se restabelecer o equilíbrio existencial. Durante a construção desse percurso, acredito que poderemos contar com a companhia de uma outra grande certeza: a de que “nunca nos sentiremos sozinhos desde que a nossa preocupação seja o bem-estar dos outros” (António Damásio).

 

Liliana Jesus

 

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21.4.09

Para ver, ouvir e pensar (com tempo). E, porque não, comentar?


  








    








 








 








  


Cidália Carvalho


 

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