A Ana é uma sem abrigo. Já a conheço há mais de trinta anos. Sempre igual a si mesma.
Contam-se histórias de que é de “boa família”. Teve um filho. Tiraram-lho. E a Ana entrou no seu mundo privado. As ruas são a sua casa. Alimenta-se do que aparece, até em caixotes do lixo. Está quase sempre bem disposta. Morena pelo sol de Verão e pela sujidade da sua pele. No Inverno, cheia de roupa. Faz frio.
Nem sei se ela sabe o que é, ou se é Natal. De qualquer forma, a noite de consoada deve ser “uma chatice” para a Ana – não andam pessoas na rua para lhe darem um cigarrito…
Há uns anos fui, com os meus dois filhos, na noite do dia 24 de Dezembro, ao encontro da Ana. Levei-lhe uma pequena ceia de consoada onde nada faltava. Ah! E mais dois maços de tabaco e uma cervejita para aquecer.
Achei que devia isso à Ana. Achei que devia isso aos meus filhos.
O Natal não é receber, é dar. Principalmente Amor.
Quem vê hoje a Ana, não deve pensar que ela já foi uma criança e que deve ter tido Natais muito felizes com a sua família. E fico sempre a interrogar-me – será que a Ana terá algum vislumbre dos seus Natais de criança? Do sapatinho na chaminé e dos presentes que recebia? Sim! Porque o Natal já teve significado para a Ana algures na sua existência!
A Ana continua a sua vida sempre igual todos os dias. Para ela é sempre Natal … Ou não! As luzes da cidade só brilham uma vez por ano!
Manuela Sousa Santos
Link deste ArtigoPor Mil Razões..., às 13:49  Comentar