Foto: Girl – Adina Voicu
Eu herdei os olhos do meu pai. A boca também. E com o passar dos anos eu percebo que herdei muito além das suas caraterísticas genéticas. Reconheço em mim alguns traços de personalidade que, na adolescência eu abominaria, pois imaginava ser tão diferente dele... Naquela época, não era capaz de reconhecer em mim alguns “defeitos” tão parecidos com os do meu pai e menos ainda, algumas qualidades.
Na maioria das vezes, quando se pensa em “herança”, vem logo à cabeça, propriedades, bens materiais e ainda uns pouco afortunados que herdam dívidas também. Pensamos pouco sobre o quanto herdamos dos nossos pais ou daqueles que estiveram presente em nossas vidas, na nossa formação como indivíduo. Acho que há uma tendência em culparmos a nossa “herança” pelas mazelas da vida e atribuir o nosso sucesso a nós mesmos. Mas talvez esqueçamos que, até os defeitos dos nossos pais, nos fazem ser quem somos. Hoje, mais madura, sou capaz de perceber que herdei do meu pai, coisas boas e ruins, e reconhecendo mais claramente em mim esses “defeitos”, tento combatê-los (muitas vezes sem sucesso).
Não tenho filhos mas se os tivesse, penso que os educaria de forma parecida com a que meu pai me educou, ainda que em alguns momentos tenha passado por sofrimento (típico dos adolescentes), hoje percebo o quanto aquelas exigências todas fizeram diferença na minha vida.
Vejo que muito além de qualquer bem material, herdamos hábitos (bons e maus), aptidões e valores. Claro que quando nos tornamos adultos podemos sempre refletir e decidir sobre o que queremos herdar. Sobre a genética não há poder de escolha, mas talvez a grande diferença da vida esteja em como lidamos com aquilo que nos foi deixado.
Leticia Silva