Agora sou quem sou! Sou o resultado do meu passado e este faz-me falta para perceber quem sou agora e, não seria quem sou, se não fosse o meu passado. Agora sou também aquilo que projeto para o meu futuro, o qual resulta do meu passado (experienciado) e do meu agora. Assim, percebo expetativas para a minha vida futura. Sérgio Godinho já dizia (diz) que “hoje é o primeiro dia do resto da minha vida”. Esta afirmação perspetiva futuro e passado. Futuro, porque hoje é o 1.º dia e, passado, porque o hoje é o resto. Assim, quando se diz “O resto da minha vida”, o futuro é analisado à luz do passado e do agora.
Ao passear na rua, no nosso trabalho, em nossa casa e em outros sítios, cruzamo-nos, muitas vezes, com a frase “o melhor será viver um dia de cada vez”. Tenho dificuldade em percebê-la; faz-me refletir sobre a vivência e a existência humana; confesso até que fico desapontada e triste… não percebo muito bem porquê; dizem-me que, pensando assim, serei mais feliz… será que me dizem para viver aquele dia com muita intensidade – viver o agora com muita intensidade? Colocar tudo no hoje? Como o faço se estiver mal com o meu passado e com o meu futuro?
Por outro lado, o agora, o hoje, não deverá ser avaliado como o “escuro que fica depois de se esgotar a luz de uma vela que desapareceu”. Cardoso (2010) ao falar de depressão realça que esta empurra para o fosso escuro da existência; está-se embaraçado, ancorado, emperrado na marcha para diante. O tempo íntimo (tempo que está dentro da pessoa) está parado, não é capaz de andar para a frente para acompanhar o tempo de fora, o tempo do mundo. Assim, não há passado nem futuro no agora da pessoa deprimida.
“Viver um dia de cada vez”; “hoje é o primeiro dia do resto da minha vida”… sinto-me bem quando percebo o hoje como o primeiro dia do resto da minha vida. Dá um sentido temporal à minha vida; dá um sentido útil ao agora, porque é o primeiro dia e, por ser o resto da minha vida, precisa de ser pensado para preparar o resto; o futuro. Assim, não me permite pensar que o “tempo do agora” é “o escuro que fica depois de esgotar a luz de uma vela que desapareceu”.
O agora parece-me ser um “sítio” de análise complexa. Será dificuldade minha…
Ermelinda Macedo