Foto: Refugee - Hassan T.
“A esperança seria a maior das forças humanas, se não existisse o desespero.”
Victor Hugo
“Em todas as lágrimas há uma esperança.”
Simone de Beauvoir
A. partiu daquela pequena cidade, num país, num continente desta Terra onde as guerras se vão sucedendo por necessidade de afirmação de uns, para o enriquecimento de outros, por insanidade de alguns, para o desespero de quase todos. Levou consigo tudo o que lhe restou: B., o filho de 16 anos, C., a filha de 14 anos, e D., o cão de C., inseparáveis.
E., a sua esposa, não partiu; ficou para sempre naquela terra por eles outrora bendita, amada e trabalhada, agora maldita, odiada e abandonada. Foi trespassada por uma bala que lhe violou o corpo, num trajeto impiedoso que lhe feriu o peito de morte.
Partir era a única hipótese para a sobrevivência. Percorreram centenas de quilómetros, quase todos contados a passo. O percurso entre o desespero e a esperança era conseguido nas lágrimas que inundavam os olhos e que escorriam nos rostos.
Conseguiram chegar a uma aldeia, de um qualquer país, de uma união europeia que acreditavam rica e próspera, humana e recetiva, bondosa e compassiva. Encontraram isso, mas também o seu contrário em alguns olhos, em alguns rostos, em alguns gestos, em algumas palavras nas quais reconheceram o medo, transformado em ódio, que tinham aprendido na sua pequena cidade de onde fugiam.
Estão à espera, não sabem bem do quê. O desespero continua-lhes preso à pele, colado pelo lado de dentro. As lágrimas, essas, continuam a ser derramadas, continuam a ser o percurso interior para o seu precário equilíbrio, para a esperança.
Fernando Couto