Foto: Camera – Th G
Há momentos, generalizo assim porque acredito que acontece com toda a gente, em que não se sabe porquê, mas ficam-nos gravados para sempre, alguns constantemente, outros ativados de forma intermitente, de longe em longe. Momentos para os quais não é imediata a razão para tal distinção, de tão singelos, simples, vulgares que são. Haverá uma teia, de fios mais ou menos visíveis que resistem na memória, no tempo.
Há momentos em que é evidente porque os sabemos situar na circunstância, o quê, quem e onde. Usando as frases batidas e dependendo das idades de cada um: Onde estavas no “25 de abril”? O que fazíamos quando soubemos e percebemos o que estava a acontecer no “11 de setembro” em NY, nas torres gémeas...
Estes são tão chocantes, envolventes, positiva ou horrivelmente, que nem temos tempo ou capacidade para pensar que estamos com a História a passar frente aos nossos olhos e que nos vamos lembrar deles enquanto tivermos os nexos elétricos da nossa memória em funcionamento. Estamos, na ocasião, totalmente absorvidos, imbuídos daquilo que acontece e que, seja mais longe ou mais perto, nos toca, choca e espanta.
Depois há as situações que nos surpreendem, melhor, superam as expetativas elevadas para as quais vamos, ou então acontecem de imprevisto e que nos são tão agradáveis que nos fazem pensar de forma grata na vida, agradecer quem somos e com quem estamos. Perante elas e no seu decurso, como que parte de nós se destaca, para, observa, prenhe de satisfação, alegria, entusiasmo, olha para o “espetáculo” em cena e diz-nos: aqui está algo que vou gravar, mais tarde vou recordar, para memória futura!
Muitas vezes esta memória não permanece vívida, desvanece-se e não acontece o que nós prevíamos, o momento não se tornou, de facto, inesquecível.
Mas também são eles, o conjunto desses momentos, meio enevoados, que nos constroem, ligam os blocos que edificam a nossa vida, a argamassam.
É uma saudade, sem rosto, sem contornos ou com contornos difusos, indefinidos, mas sem a qual nós não seríamos integralmente nós. E, sim, a saudade é mais dos momentos felizes, de alegria transbordante, mas, com o longo prazo que já começo a experienciar, digo que também podemos ter saudade, sem ser incongruentes, de momentos tristes, infelizes. A vida é mais de emoções que de razões, será isso.
Eu sou a minha saudade (também pode ser no plural) mais o que me espera e procuro no futuro. Um filme, uma sequência de fotos, com muitos flashbacks, saudades, memórias.
Jorge Saraiva