Foto: Girl - Cheryl Holt
Disse-te, na única vez em que nos demoramos nas palavras, que nem todas as figuras geométricas me agradavam, sobretudo triângulos. Respondeste com uma sonora gargalhada e uma apaixonada dissertação sobre os três vértices que a ti te faziam tanto sentido. Apesar de eu gostar das palavras que pincelaste, dos sons que, juravas, contavam histórias de amor, dos cheiros que inebriavam a alma, não encontrei harmonia em nenhum dos teus predicados: quanto mais falavas sobre eles, mais eu rodopiava no vórtice do teu desconcerto. Deixei de te escutar quando te disse que nada tinha para te oferecer e tu continuaste, alheio à minha vontade, argumento atrás de argumento. Se não estivesses tão empenhado em queimar razões a troco de nada, poderia ter-te dito que também tu nada tinhas para me oferecer e que esse é o teu caminho, não é o meu. A tua insistência nunca poderia recrutar-me mas a tua arrogância impediu-te de perceber que nem todos vibram na tua frequência. Não está certo nem errado, não é bom nem é mau, é o que é. Queremos coisas diferentes, sabes? O amor na tua vida tem três vértices e arestas afiadas, nunca descansa e salta refeições a troco de uns petiscos. Na minha, deita-se numa cama de dossel iluminada pela luz de um vitral de Fibonacci e repousa num par de braços onde se espelha. Na sua ausência, só a completude do Ser, e apenas ela, me alimenta. Nada disto te faz sentido, pois imagino que não. Vá, não percas mais tempo a explicar-me as mil vantagens do “amor moderno” e as triangulações da tua intimidade. Olha, está ali alguém com Pitágoras escrito na testa. Faz-nos um favor a ambos: vai lá vender-lhe o teu peixe e deixa-me aqui com o Marvin que canta, só para mim, este amor antigo e gostoso.
Alexandra Vaz