Foto: Woman - 5776588
Hoje acordei e, antes mesmo de abrir os olhos, pensei que seria um bom dia pois a noite foi calma cá em casa, com sonos retemperadores e descansados.
Olho-me ao espelho, já com a cara lavada com água fria e vejo que tudo está bem. Consigo escrever um e-mail de trabalho ainda a tomar o pequeno-almoço, adivinhando um dia produtivo.
De repente, cruzo olhares com o depois e a ideia de que tudo está bom sai a correr. Vejo-a fugir e fico em pânico. Começo a ficar mais nervosa, cada vez mais e mais nervosa e eis que tudo acontece. Tudo à minha volta é um caos, gritam comigo e tento não gritar, mas já vou perguntando “Porquê?”. Por que razão não há um dia em que a ideia de que será um bom dia não me abandona durante esse mesmo dia? Então, tudo acontece...
Se antes estava com boas energias, essas desaparecem e o meu pânico é maior pois convenço-me que nem sequer tinha direito de as ter tido em algum momento. Se conseguia suportar os gritos dos outros, esses mesmos gritos abandonam os seus corpos iniciais e passam todos para mim, sendo invadida por ataques de histeria louca, dos quais tenho consciência e abomino. Abomino-me a mim...
Se antes olhei para o espelho e tudo era bom, esse mesmo espelho mostra-me agora uma cara vermelha da própria raiva de existir, olhos a pedir para nunca mais serem vistos abertos por ninguém, lágrimas a pedir perdão por existir.
A alma quer sair do corpo, mas o racional não deixa. Estou presa em mim mesma, nesta minha neura, nesta minha existência medíocre. A pessoa que sou abandona-me e deixa-me à deriva com esta loucura.
Já consegui deixar todos à minha volta de olhos arregalados, mas que se dane! Sofram as consequências por conseguirem deixar-me assim.
Mas eu gosto tanto deles... Eu que já cá não estou. Eu que fui expulsa do meu próprio corpo para dar lugar à insanidade. Sinto ódio, abandono o amor, aquele que tanto acredito e desejo... Não é opção, mas é uma realidade. Uma estúpida realidade que só a mim diz respeito.
Sónia Abrantes