26.7.14

 

O meu mundo era normal até ao dia em que percebi que dentro de mim havia algo que não tinha cura. Cresci numa adolescência pacífica, apenas vítima de muitas borbulhas no rosto, mas pouco mais do que isso! A vida tinha crises, mas apenas existenciais. As dores vinham dos amores platónicos, das amigas menos compreensivas e das disciplinas menos fáceis. Passei grande parte do meu tempo a dançar e a amar! Sempre amei com intensidade e sempre me entreguei sem reservas. Um dia casei. Depois tivemos um filho. Divorciámo-nos e eu fiquei com o meu filho e com uma descoberta que mudou a minha vida para sempre. O meu filho nasceu de cesariana e nessa cicatriz que nos une, o meu corpo decidiu pregar-me uma partida! As dores começaram pouco depois de ele nascer, talvez um ano depois. Um pequeno nódulo, acompanhado de dores razoavelmente fortes durante a menstruação, levaram-me ao médico. Vim de lá contente e feliz com o meu antibiótico na mão e a solução à vista! Tão bom quando não é nada grave e passa se tomarmos aquilo até ao fim! Crente! Estupidamente crente… deixei-me ficar à espera que passasse! A verdade, é que deixei a minha dor física ficar equiparada à dor emocional da perda, e durante anos não consegui libertar-me de nenhuma delas. Aquele pequeno nódulo cresceu, notava-se no biquíni e dava-me dores infernais!

Há um dia na vida, que no meu caso penso que foi tardio, em que as dores nos ganham, e antes de sucumbirmos de vez, decidimos lançar a nossa sorte nas mãos dos médicos. Sentei-me e contei tudo. Falei da dor que me matava por dentro, que pareciam facadas na barriga, vezes e vezes sem conta e do medo das cirurgias. Segundo a médica, era uma hérnia, mas mesmo assim o melhor era ser vista! O meu terror por cirurgias fez-me ficar em sobressalto, mas naquele minuto em que se quer desistir, agarrei-me à certeza que daquela vez ia ser diferente. Então fui em frente, e passei grande parte do meu tempo dividida entre mim, a família e os diagnósticos médicos. A doença foi-se descobrindo. Durante uma ecografia foi-me alertado que poderia ser uma Endometriose. Não sabia o que era, mas voltei a acreditar na teoria de que com o antibiótico ficaria curada! Cheguei a casa e sentei-me em frente ao computador. De certeza que existia esta doença no Google!. Não só existia, como dava muitas dores e não tinha cura! Questionei: porquê a mim? Não que a desejasse a alguém, mas como qualquer ser humano, questionei que mal tinha feito para merecer tal castigo! Seguiram-se dias de dores, de conflitos emocionais e de exames de diagnóstico complementar. Foi assim que a Endometriose invadiu a minha vida! Senti-me revoltada, chorei bastante e percebi que em mim tudo tinha que mudar, acima de tudo a minha forma de encarar a vida e o meu corpo. A minha vida durante esses meses foi um inferno! Dores que me incapacitavam de andar, sorrir e ter vontade de me levantar da cama. Tu não andas, vives agarrada a analgésicos, deixas de aceitar convites para sair, o sexo passa a ser uma miragem e a tua vida vira-se de pernas para o ar! Acontecia dentro de mim algo que eu não entendia e que não me conseguiam explicar muito bem de onde vinha e porquê! Foi-me diagnosticada endometriose profunda, com dois focos: na cicatriz da cesariana e no septo reto vaginal. No dia 11 de Outubro de 2013 foi a minha vez de me submeter a uma laparoscopia. Estava nervosa, e depois todo o processo pré-cirúrgico é muito agressivo! Mas quando acordei das minhas 4 horas de bloco operatório, fiz as pazes comigo e com a doença. Tiraram-me um nódulo com 10 cm de diâmetro, que ainda hoje está fotografado no telemóvel da minha médica como “um dos maiores que vi!”.

Sabia que tinha que encontrar uma forma de viver com a endometriose, se não ia ser infeliz para sempre, e isso é algo que eu não desejo e não atraio para a minha vida.

Se antes eu tinha um alto na barriga, agora fiquei com um buraco! Mas a verdade é que fiz as pazes também com a minha barriga e olho para ela como uma guerreira que faz parte de mim e que também aos poucos vai vencendo batalhas... e quem sabe um dia a guerra! Vivo focada na cura, e tenho tentando transmitir esta forma de estar e viver a muitas mulheres que conversam comigo sobre a doença, a sua infertilidade e os seus receios. Partilhamos uma dura herança e com isso temos que nos unir e juntas encontrar soluções para viver cada dia com um sorriso.

A minha vida mudou! Voltei a praticar exercício e a minha alimentação se já era cuidada, agora é super-cuidada! Acredito nas terapias alternativas e tenho-me socorrido muito do Reiki e do pensamento positivo. Comecei a conhecer muito melhor o ritmo do meu corpo para minimizar sintomas e com isso, tudo tem fluido muito melhor! A endometriose mudou a minha vida, mas também me alertou para algo: temos que gostar de nós e respeitar o nosso corpo!

 

Sara Aisha

 

Artigo publicado no âmbito do Acordo de Cooperação entre o blogue Mil Razões… e a MulherEndo.

 

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