Minha alma é uma orquestra oculta; não sei que instrumentos tangem e rangem, cordas e harpas, tímbales e tambores, dentro de mim. Só me conheço como sinfonia.
Fernando Pessoa, Livro do Desassossego
A Consciência, é o quê?
Dizem-me que já estive sem ela e deve ser verdade porque há seis dias na minha vida que, para mim, não existem. Ou por outro lado, pelas consequências que tiveram tenho a certeza que infelizmente existiram. Se fosse só pelos relatos, orais e escritos, duvidaria até hoje. Mas não, o meu corpo e a minha mente repetem-me constantemente e implacavelmente que sim, que embora “Eu” não estivesse lá, estava. Depois seguiram-se mais seis dias em que, na maioria das opiniões dos outros, terei continuado sem consciência, porque estados de coma, ainda que induzidos e de sedação profunda, levam-nos daqui para fora.
Diz o magnífico António Damásio, no seu Livro da Consciência, que a consciência é um estado mental em que temos conhecimento da nossa existência e da existência daquilo que nos rodeia. E, se bem o entendi, nem a dormir temos consciência. A consciência, continua Damásio, é o estado mental particular que inclui o conhecimento de que a dita existência ocupa uma certa situação. Antes que alguém adormeça de tédio, perdendo portanto a consciência, vou parar de citar autores brilhantes e de repetir incessantemente a palavra “consciência”, está bem?
Com tudo isto queria chegar apenas ao que sinto e ao que penso, depois de um hiato na minha existência (se estamos inconscientes, estamos vivos?). E a esse nível, falhando-me certamente conhecimentos científicos mas com o impulso da minha experiência pessoal, acho que tudo se resume a sabermos que somos.
Se aqui estou hoje a escrever este texto é, seguramente, porque mesmo “em coma”, ou coisa do género, senti sempre que era eu, fosse lá essa pessoa quem fosse. E que havia pessoas que amava e que ainda precisavam de mim; uma delas a sussurrar ao meu ouvido, teimosamente e contra todas as lógicas aplicáveis ao meu corpo e à minha mente, que voltasse, que recuperasse a nossa vida, que estava ali à minha espera. Durante os dias que se seguiram, ignorando a medicina e os maus augúrios que pairavam em atos e palavras, essa pessoa não desistiu. E eu, teimosa e empenhada, sabendo que não estava só, fui voltando. Ainda estou a voltar. Como me disse uma terapeuta, recentemente, o meu corpo agora é como um filme: tem várias sequelas. Eu ri-me a bom rir, não só porque adoro piadas como também só tenho motivos para rir. Estou com a minha família. Perdoem-me o vernáculo, mas sinto que fiz um manguito à Dona Morte.
Em conclusão, enquanto soubermos que existimos e que temos motivos para existir, temos consciência. E temos poder. Agora é só usarmos esse poder para espalhar Amor.
Assim à laia de pseudoescritora intelectualoide:
Minha alma é um espaço oculto; não sei que planetas e estrelas o habitam, quantas galáxias nascem e morrem nele, quandos buracos negros domina, quantos novos sóis brilham hoje nele, onde começa ou onde acaba. Só me conheço como universo.
Laura Palmer