As rimas são traiçoeiras, podem associar palavras cujos significados em nada estão relacionados. Ou serão matreiras, juntando palavras que afinal têm algo mais em comum do que o som da última sílaba e nós não víamos até então?
Neste caso, penso que tem um pouco destas duas perspetivas, ou não será a adolescência a altura da vida em que se começa a experimentar o desconhecido e até proibido, e a delinquência o ato de fazer algo que está fora do padrão dito normal para a sociedade em que se está inserido.
Uma rapariga com 12 anos, com um ano de experiência a ir para a escola sozinha ou só com os colegas, começa a sentir que o seu dia-a-dia pode ser mais do que ir para a escola certinha, frequentar as aulas e ter boas notas, brincar um pouco com os coleguinhas, e voltar para casa pelo mesmo caminho. Um dia arrisca e aceita conversa com um grupo de rapazes que estão sempre no mesmo sítio, no muro perto da escola, e vai ter com eles. Afinal até são simpáticos e vai ficando cada vez mais tempo e mais tardes seguidas. Continua a fazer o mesmo percurso até casa, mas uns dias sozinha porque os colegas já foram e ela ficou no muro.
Os seus novos amigos oferecem-lhe algo novo, um cigarro, e ela recusa prontamente pois, apesar de não ter o hábito de faltar à escola, até já tinha experimentado com outros amigos, dentro das suas brincadeiras certinhas. Isso ela já sabe que não é do seu interesse, cheira mal e, dizem, até faz mal à saúde e custa dinheiro que ela quer para outras coisas.
Um dos amigos começa a ser mais do que só um amigo e pede-lhe em namoro e ela aceita. Os beijos começam e ele questiona se ela está a gostar da experiência por pensar ser a sua primeira vez. A rapariga responde que sim, mas não consegue comparar com o seu primeiro namorado, pois são pessoas diferentes, de contextos diferentes e hábitos diários e familiares diferentes. Ele experimenta e oferece os seus carinhos em campos mais profundos, dizendo até que já tem experiência na vida sexual, mas ela recusa referindo que apenas dará esse passo quando pensar que será um momento de sonho que tem bem vincado nos seus projetos.
O ano escolar avança e a época dos testes chega e, em vez de estar apenas na conversa no muro, a rapariga começa a levar as suas folhas de estudo para estudar no muro. Afinal, é um local onde se sente bem e que tem a companhia de pessoas que a fazem sentir bem também. Eles ficam curiosos e ela passa algum tempo a falar dos conteúdos dos testes, de como são as aulas do seu ponto de vista.
Um dia, só as raparigas do grupinho que se juntava no muro, decidem fazer um passeio só de raparigas como boas raparigas rebeldes que são, onde incluíram uma passagem pelo minimercado da vila e tentaram roubar rebuçados, apenas pelo ato aventureiro de roubar. São apanhadas e a rapariga vê-se a argumentar com a gerência do minimercado que dar essa notícia aos seus pais seria bastante injusto pois eles não mereciam. A gerência nada fez, soltaram-nas e esse dia acabou com a rapariga a dizer à mãe o que tinha feito, pois ninguém deveria levar com as consequências dos seus atos sem ser ela mesma.
Hoje, adulta, não rouba nem fuma, trabalha e investe no que acha melhor para si e para os outros, veste o personagem dos outros para os tentar ajudar, valoriza todos os amigos como se fossem únicos e respeitando o seu espaço e diferenças.
Se não fosse a delinquência dos 12 anos, talvez não fosse a pessoa que é hoje. Teve a sorte de pertencer a uma família que a deixou voar e explorar os caminhos que a vida oferece, nunca deixando que esses caminhos a levassem para um beco sem saída.
Sónia Abrantes