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Chamava-se Luís mas todos o tratavam por Luís Dança. Veio de fora e vivia sozinho num pequeno casebre que uma qualquer boa alma lhe cedeu. Nunca recebeu visitas e não se lhe conhecia família. Dizia-se que tinha uma filha, casada e bem posicionada na vida, mas a hipotética parente nunca apareceu para confirmar a sua existência. Para viver contava com a caridade alheia e pequenos biscates que fazia, quando lhe era solicitado. Um martelo e um fio-de-prumo, e era vê-lo a construir muros em pedra com uma perfeição tal que fazia dele um pedreiro respeitável. Humilde e educado de aspeto frágil, foi adotado pela aldeia quando para ali se mudou. Homem de paz, com todos se relacionava bem e todos nele confiavam.

Mas, se a relação com os seus semelhantes era pacífica já o mesmo não acontecia com o dinheiro. Não queria nada com o vil metal. O desprezo era tanto que se livrava dele da forma mais degradante que conhecia, o álcool. Se, dos pequenos trabalhos que fazia, lhe pagavam em dinheiro, só voltava a trabalhar quando este tivesse desaparecido do seu bolso para a caixa da taverna do Sr. Abel. Nesses dias Luís Dança arrancava-nos à pacatez da vida na aldeia e prendava-nos com danças acrobáticas e exercícios de equilíbrio. Era exímio na dança com o copo cheio na testa sem que dele se soltasse uma gota do precioso líquido. Por vezes aventurava-se no canto, mas aí já não era tão perito, porque a voz denunciava o seu estado. E foi assim que a seguir ao nome que os pais lhe deram, a aldeia acrescentou o “Dança”. Quando lhe perguntavam porque bebia, a resposta não vinha embrulhada em enigmas filosóficos - para gastar o dinheiro. Ter dinheiro incomodava-o, não lhe deixava ter descanso.

Contava-se que uma das vezes em que tinha uns trocos no bolso, não conseguindo convencer o Sr. Abel a levantar-se, a altas horas da noite, para lhe servir uns copitos, deitou o dinheiro à rua. Não sei de outra razão para tamanho desprezo senão a que ele dizia em jeito de homem sábio, que o dinheiro muda o homem e ele não queria mudar. Poderão existir outras razões para além desta, sendo que esta nem sequer é, para mim, uma razão válida para se relacionar tão mal com o dinheiro, mas concordo com o princípio de que o dinheiro muda o homem. Muda o homem, as pessoas com quem se relaciona e tudo o que o rodeia. Mas, contrariamente ao Luís Dança, eu não me importava nada de mudar, promoveria essa mudança. Policiar-me-ia para que não fosse o dinheiro a ditar as regras da minha vida mas saberia reduzi-lo àquilo que ele é, um meio de concretização de sonhos, meus e dos outros, de bem-estar, de liberdade e generosidade.

 

Cidália Carvalho

 

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