“Desorganize-se! Tenha uma nova experiência de vida. Ajudamos a desorganizar-se. Contacte-nos.” Logo por baixo aparecia um número de telefone, um e-mail, uma morada.
Carolina ficou imóvel a reler tão estranho anúncio, impresso no seu jornal da manhã de sábado, habitualmente consumido com uma cevada dupla e um queque, no conforto do café, em mesa junto à montra, de onde lançava olhares esporádicos ao jardim fronteiro. Pensou ser absurdo. Absurdo, não – estúpido, é mesmo estúpido, acrescentou. Deve haver alguma ideia, alguma coisa por trás disto… Surpreendida e intrigada, Carolina esticou-se nas costas da cadeira. Toda a vida se esforçara em ser organizada, em otimizar a sua organização, em alguns aspetos tinha mesmo conseguido algum requinte organizacional. A sua casa, a sua família, o seu contributo laboral, eram claramente o resultado do seu esforço organizativo e gostava de pensar em tudo isso como um relógio em perfeito funcionamento.
Já em casa, após uma passagem pelo supermercado para as compras de sábado, o desassossegante anúncio não saía do pensamento de Carolina, provocando-lhe alguma irritação. Tinha de fazer alguma coisa! E fez. Telefonou para o número do anúncio.
A conversa, com aquele homem de voz suave e calma que transmitia tranquilidade, foi ainda mais surpreendente. Ele representava uma empresa que ajuda as pessoas a deseorganizarem-se, a sentirem a vida de forma diferente, a serem verdadeiramente felizes, como ele explicava. E como fazem esse trabalho? Fácil! Deslocam-se ao domicílio do cliente, analisam a sua vida em pormenor e entregam um plano de desorganização, para que o cliente o coloque em prática. E acompanham a aplicação do plano, dando consultoria e, eventualmente, introduzindo alterações no plano original, se a experiência revelar essa necessidade. Todo o processo está terminado ao final de trinta dias, ou seja, um mês depois o cliente está garantidamente desorganizado e feliz, ou então será reembolsado. Carolina estava paralisada. E todo aquele trabalho de análise, planificação e desorganização, até era em conta… Como não experimentar? Como provar ao idiota que criou tal empresa que tudo aquilo era completamente estúpido e impossível de concretizar? Carolina só encontrou uma resposta – contratar os serviços da “Não quero saber… – Consultores”. Nessa mesma tarde, em casa de Carolina, começou o trabalho de análise.
Uma semana depois, Carolina recebia o seu “PPD - Plano Pessoal de Desorganização”. Leu atentamente os seus sete pontos-chave e os detalhes pessoais que se seguiam a cada um deles: 1 – Guarde tudo pois um dia pode ser útil; 2 – Coloque qualquer coisa em qualquer lugar; 3 – Trate de tudo sempre na próxima semana; 4 – Nunca arrume - procure o que quer no meio da confusão; 5 – Use apenas a sua memória; 6 – Esteja sempre atrasada; 7 – Perca pelo menos um objeto pessoal por dia.
Ficou sem palavras, mas num impulso, o seu consultor pessoal de desorganização colocou mãos à obra.
Seis meses depois, Carolina sentia-se mais feliz do que nunca, sem vestígios de stress. Luís, o homem de voz suave e calma que transmitia tranquilidade, perguntou a Carolina, ao verificar o seu percurso de sucesso para a desorganização e felicidade:
- É possível viver com organização?
Carolina respondeu prontamente:
- Sim, mas não é a mesma coisa…
Fernando Couto