15.12.08

 



 


No meu tempo, o Natal...

 

Esta seria a forma mais comum de começar a falar das recordações guardadas de tantos Natais. Seria, se não vivesse os dias de hoje como sendo o “meu tempo”.

Incluo-me neste tempo, com vontade de viver, sentir e agarrar sensações. Todos os dias se processam em mim, e no exterior a mim, alterações, mas não me excluo destas alterações, acompanho-as.

E por isso, recomeçando...

 

O meu Natal de há uns anos não é igual ao Natal de hoje. Há uns anos atrás, a visão de, na noite de Natal, não ter a merecida prenda do Menino Jesus, em minha casa, no meu sapatinho, condicionava com alguns meses de antecedência o meu comportamento. Desde o portar-me bem, a fazer os TPC da escola, a ajudar na lida de casa, tudo era condicionado pela promessa do prémio que receberia na manhã do dia 25 de Dezembro.

No dia 24, à noite, atrasava quanto podia a hora de me deitar, na esperança de que o Menino Jesus viesse mais cedo e eu ainda estivesse acordada. O cansaço vencia-me e, de ano para ano e todos os anos, ficava com muita pena de não o ver.

Gostava da surpresa que me deixava como prova da sua passagem, mas lembro-me que ficava um “amargozinho” por nunca o conhecer.

 

O Natal era vivido com esta intensidade à luz dos meus olhos e à dimensão da minha idade.

Talvez por isso, ou talvez não, não me lembro de acções de solidariedade que percebo e vivo actualmente.

E hoje, para mim, Natal é mesmo isso - solidariedade.

Entristece-me, mais do que noutros períodos do ano, a miséria humana. Conforta-me, como se fosse eu a comê-la, a sopa, as bebidas quentes e os agasalhos distribuídos aos sem-abrigo. Comovo-me com o Natal nos Hospitais. Participo na recolha de alimentos para o Banco Alimentar. Sorrio com as peças de teatro apresentadas pelos reclusos...

 

Fixo-me neste último grupo para recordar um episódio duma das minhas idas a um estabelecimento prisional.

O objectivo era comprar móveis feitos pelos próprios reclusos que, segundo sabia, eram de muito boa qualidade e muito em conta em termos de preço.

 

Não era a primeira vez que visitava este estabelecimento prisional, mas, por não ser de livre acesso, pela grandeza do edifício, pelo fim a que se destina, ou por outra razão qualquer, sabe-se lá qual e, sem qualquer intenção da minha parte, quando me dei conta estava a fazer um reconhecimento pormenorizado do local e a procurar ter um comportamento exageradamente natural.

 

Muitas pessoas tiveram a mesma ideia que nós (eu tinha ido acompanhada), pois o armazém de exposição estava cheio.

As pessoas olhavam, tocavam e mostravam-se interessadas questionando sobre os materiais preços e condições de pagamento.

O recluso de serviço não tinha mãos a medir. A todos procurava responder, a todos procurava atender.

Nós estávamos muitos indecisos; a oferta era grande, os móveis eram realmente bonitos e com qualidade. Mas por qual decidir?... E íamos vendo, tocando, tirando uma ou outra dúvida com o recluso. Foi então que reparei que ele estava um tanto ou quanto inquieto; solícito, mas algo inquieto.

Percebi que eram várias as solicitações e começava a estar muito pressionado. Eu quis ser simpática e atirei com a frase socialmente correcta: “Não se prenda connosco…”.

O inconveniente da frase, naquele contexto, só foi minimizado pela expressão de descontracção do recluso.

Naquele constrangimento, não sei se ouvi, ou se imaginei ouvi-lo responder: “Não! Não me vou prender, já me prenderam...”.

 

A TODOS UM BOM NATAL!

 

Cidália Carvalho

 

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Link deste ArtigoPor Mil Razões..., às 14:00  Comentar

De Cidália a 19 de Dezembro de 2008 às 22:44
Esqueci-me de assinar o comentário anterior.

De Anónimo a 19 de Dezembro de 2008 às 22:43
m.a.,
Obrigada pela informação.
Vale mesmo a pena ver. Eu vi e gostei muito.

De m.a. a 19 de Dezembro de 2008 às 09:26
Vale a pena perder tempo com esta Entrevista:


http://www.roberthappe.net/port/video.htm


De Susana Cabral a 17 de Dezembro de 2008 às 20:20
Olá Cidália

Não posso deixar de tecer um comentário a uma pequena frase:
"...para mim Natal é mesmo isso solidariedade."
Respeito, sem dúvida a sua opinião, mas para mim a solidariedade não deve estar associada a uma época , a um feriado ou ter um dia marcado no calendário.
No Natal as pessoas estão mais predispostas para a solidariedade, mas para mim, esta serve apenas para "limpar a consciência " e para muitas dessas pessoas de certeza que pensam "ah! já cumpri com o meu papel, este Natal ajudei..." e pronto lá se gerou um gesto de altruismo.
Provavelmente no Espírito do Natal se encontra a essência da solidariedade mas assisto a esse espírito acabar logo logo a seguir a entrada do Novo Ano.

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