O domínio da incapacidade de escutar não é o mesmo do da incapacidade de ouvir: aceitamos que alguém não é capaz de ouvir, porque o seu organismo não lho permite, mas é difícil aceitar que outra pessoa não seja capaz de escutar (especialmente se queremos ser escutados) – afinal, o que a impede?
É frequente ouvirmos que hoje em dia as pessoas são incapazes de escutar, ou que fulano ou sicrana não me compreende (logo, não me escuta). Como se escutar fosse tão natural como ouvir. Sabemos que não é.
Escutar outra pessoa pressupõe dar-lhe atenção (“Escuta com atenção” é um pleonasmo!): pelo menos ao que diz, como diz e como encadeia o seu discurso; e para fazer isso, é necessário que o pensamento de quem escuta não divague para outras paragens, nem esteja ocupado com concordar, discordar, refutar, comparar, interpretar, julgar, etc.. Difícil, não é, descentrarmo-nos do nosso umbigo? Quantas vezes já nos apanhámos a descarrilar mesmo estando a fazer um louvável esforço?
Sim, porque escutar exige um esforço da vontade - é preciso querermos escutar para nos dispormos a fazê-lo (termos tempo e vontade para); e provavelmente queremos fazê-lo por considerarmos que vale a pena. Escutar tem de fazer sentido para quem escuta, tenha que ver com a pessoa que se exprime, com o que é dito, com a situação ou até com as suas próprias convicções. Escuto o meu filho para o compreender e para que ele sinta que o amo e estou com ele; escuto o meu cliente para, compreendendo o que procura e o que o orienta, poder servi-lo melhor, o que será proveitoso para o meu negócio; escuto aquela melodia até se entranhar em mim porque me dá prazer.
Enfim, aprendemos a escutar. Ou não.
Ana Álvares
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