5.10.09


 


Estou aqui a olhar para ti. Olha para mim também, por favor, quero saber o que estás a dizer.

Estás tão habituado a ver-me ser auto-suficiente que te esqueces. Esqueces-te de que não te ouço. Sabes bem que esta diferença nunca me parou, nunca me derrubou, e acho que nem te lembras que existe. Mas está aqui.

Eu já nasci assim e por isso, isto para mim não é uma incapacidade, é uma diferença. Obrigou-me a ser criativa, a descobrir como superar obstáculos que para ti não existem. Eu tenho de contornar obstáculos físicos e isso ensinou-me a superar os obstáculos psicológicos.

E ensinou-me a rir, a perceber o poder do sentido de humor.

De vez em quando até dá jeito. Há coisas que é mesmo melhor não ouvirmos.

O Mundo não faz um grande esforço para se adaptar a mim, tive que ser eu a descobrir como adaptar-me a ele. Mas isso não acontece só aos surdos, pois não? Acontece aos que não podem ver, ou falar, ou andar. Acontece aos que mostram diferenças, físicas ou psicológicas. Acontece aos homossexuais, aos muito gordos, muito baixos... acontece a tanta gente que se nos juntássemos todos, os ditos “normais” é que ficavam em apuros.

Mas é mesmo assim, há os olhares de curiosidade, de pena, de desprezo. Isso também nunca me afectou muito, é um problema deles, não meu. Eu construi a minha vida, cresci mais forte e mais determinada. Eu vivo bem com este silêncio. Pelo menos na maior parte do tempo.

Mas por vezes... às vezes é difícil. Penso como seria ouvir um pássaro a cantar, as ondas a bater na praia, distinguir sotaques. Penso como seria ouvir a música enquanto danço. Ou emocionar-me até às lágrimas a ouvir uma área de Ópera.

E sobretudo, penso como seria ouvir-te quando dizes que me amas, ou a voz do nosso filho quando diz “mãe”.

 

Dora Cabral


 

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Link deste ArtigoPor Mil Razões..., às 22:21  Comentar

De Cidália Carvalho a 7 de Outubro de 2009 às 19:43
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