Foto: Mom - Unsplash
- Quero subir para aí contigo, mamã! - dizias, como se fosses embarcar numa aventura inelutável. Os teus olhos grandes a engolir o mundo brilhavam enquanto, impaciente, saltitavas em pontas.
Segurei-te pelo tronco e puxei-te para mim. O sol tímido roseava-te o rosto pousado no meu peito. Devagar, baloicei-nos e deixei que a brisa nos afagasse os cabelos. Dancei os meus dedos pelas tuas sobrancelhas e desenhei-te a face vezes sem conta. As tuas pestanas longas, negras, cerravam-se aos poucos. Estavas ali. Meramente ali, comigo, nesse dom, que só as crianças possuem, de estar verdadeiramente e completamente onde estão.
E naquele instante, todos os relógios pararam. Eras outra vez o bebé que há anos embalei no meu regaço. Sussurrei-te em silêncio as saudades que me trouxeste. Sei que me ouviste. Como me ouves de todas as vezes que te sorrio sem nada dizer. E eu fui criança também, eu estive ali, meramente ali, contigo, connosco e com os ponteiros de todos os relógios do mundo, interrompidos, suspensos, como nós, naquela cama de rede, sob o abraço do sol.
Amo-te, amo-te em paz. Amo-te tão tranquilamente, tão intensamente e tanto… como todos os amores deveriam amar. Esse amor que se balança, sustado e eterno.
De repente, olhaste para mim, olhos enormes a engolir o mundo outra vez:
- Mamã! Quero ir jogar à bola com o mano!
Saltaste para o chão depressa, correste e os relógios regressaram ao seu compasso. Deixei-te ir, como te deixo ir “crescendo” a cada dia que passa, escapando-me das mãos. Sei, porém, que sabes (tão bem) que no meu coração não habitam relógios. Podes voltar ao meu regaço que eu prometo que o tempo para de novo e que não digo a ninguém que te balanço como em criança, neste amor sustado e eterno.
Vanessa Brandão