30.5.16

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Foto: Girl – Adina Voicu

 

Nenhum terreno lavrado pela mentira pode ser resgatado. Cada dia a mais nessa demanda corrói a esperança e a alegria, reduzindo-as a cinzas na alma. Não há harmonia no livro guardado na prateleira, outrora um dos nossos favoritos, agora com várias páginas dobradas, reescritas pelo punho de quem nada sentiu. Nenhuma história está verdadeiramente terminada sem integridade, sem paz de espírito. Ainda que dilacere, há nobreza na verdade; só assim é possível curar, sobretudo aquilo que nunca nos pertenceu. Viver na mentira é como viver um luto sem morto para sepultar. Nenhuma cama é confortável, ou embala o sono de cada dia, quando se enfrenta a revolta e a dor. Somam-se noites vazias. Sem sonhos, sem vontades, mas sem pesadelos. Pode até ser suficiente, durante um tempo de perplexidade e torpor, mas não tem uma chancela vitalícia. Só se o permitirmos.

Não é preciso perpetuar o sofrimento, mesmo que este pareça irreversível, mas é preciso escolher sair dele. Ainda que doa. É preciso querer caminhar, para qualquer lado, nem interessa muito bem para onde ou porquê; mas andar em frente, sair dali, daquele terreno movediço onde nada de bom acontece. É preciso deixar ir a incongruência que mina a vida. É preciso virar as costas, sem pensar demasiado e perceber que tudo vai ficar bem. Viver a paz que vem de dentro significa amar cada oportunidade de crescimento e renascer na essência que, afinal, não pode ser destruída por forças externas.

 

Um dia, o vazio contínuo da noite vai ser preenchido por borboletas coloridas, uma sensação de incrível bem-estar e a certeza de que se está vivo. Nesse dia, o terreno antigo, já não fará falta nenhuma. Agora estéril, repousará nas memórias tristes do passado, que tempo algum poderá apagar, mas não fará parte do presente. Quando os pés nos levarem noutra direção, é possível que ali, mesmo ao lado, esteja outro terreno, preparado para dar e receber vida. Pode até ter estado ali o tempo todo mas que interessa isso, quando se perdeu tempo tão precioso a tentar resgatar o que já tinha escolhido morrer? Não há reciprocidade no egoísmo, não chega amar por dois na ausência da gratidão e da lealdade. Todavia, não foi tempo perdido. Há, com certeza, muito a aprender com tudo isto.

O terreno árido de cada um de nós permanece até conseguirmos fechar o ciclo e para nos lembrar a coragem que nasceu connosco: afinal, fomos capazes de sobreviver a tudo o que já vivemos até hoje. Para trás, deixamos os medos que não escolhemos ter e o luto da alma. Sabemos que estamos no caminho certo quando já não temos vontade de olhar para trás, sobretudo nos momentos de maior vulnerabilidade. Cada dia em frente traz uma profunda gratidão pelas batalhas enfrentadas e vencidas, por cada cicatriz que nos lembra o quão forte é a nossa essência e aquilo que merecemos. E só quando nos permitimos o que merecemos, atraímos o que precisamos.

 

Alexandra Vaz

 

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27.5.16

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Foto: Girl - Madsmith

 

Todos nós temos alguma coisa para dar e é difícil dizer o que é mais precioso. Para quem tem fome, não existe nada melhor que receber um prato de comida. Para quem se sente só, atenção e companhia são bens valiosos. Claro que quem tem dinheiro sobrando, pode ajudar em muita coisa, mas não é só com dinheiro que podemos ajudar quem precisa. E na verdade todos nós precisamos de algo. O facto de pararmos para pensar em que podemos ser úteis para alguém, já é em si um grande trabalho e, antes mesmo de dar alguma coisa, já estamos recebendo. Estamos refletindo sobre nós mesmos e descobrindo os nossos potenciais. Sempre temos alguma coisa para dar: atenção, educação, tempo, amor, carinho, paciência, compreensão, companhia, trabalho e dinheiro, são exemplos.

 

Atualmente é cada vez mais difícil as pessoas se doarem. Vivemos cada vez mais dentro de uma bolha que é a nossa vida e a nossa família, sem nos importarmos muito com o que acontece em nossa volta. E em meio a essa vida agitada, cheia de afazeres e preocupações, nos perdemos na nossa rotina e nos esquecemos de olhar para o outro. Muitas vezes, não é preciso mudar uma vírgula da sua rotina para se doar. Não ignorar e, sim, ouvir a conversa da senhora idosa que reclama da vida na paragem do autocarro, é doar um pouco de atenção ao próximo, sem nos exigir muito. Está bem, tem dias em que estamos mesmo sem a menor paciência e com a cabeça cheia com os nossos próprios problemas mas, às vezes, ouvir as outras pessoas nos traz uma outra perspetiva da nossa própria vida. Nos colocar no papel no outro, nos faz pensar naquilo que estamos construindo para nós. As formas de nos doarmos, são muitas e essas oportunidades aparecem sempre. Deixar passar à frente quem tem pressa, quando nós não temos, é se doar. Devemos agradecer a todas as circunstâncias e pessoas que nos põem à prova, pois sem elas não temos oportunidade de nos transformarmos. Não importa assim o quê, nem quanto oferecemos, mas sim que essa oferta seja genuína, pois no final, ao nos doarmos, só podemos agradecer a oportunidade de nos tornarmos pessoas melhores.

 

Letícia Silva

 

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25.5.16

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Foto: Peach - Wokandapix

 

Dou aquilo que me faz mais falta.

Porque, quando dou, não fico mais pobre.

E o vazio que existe não se torna maior. De certa forma, até se preenche um pouco.

Porque, ao dar, recebo sempre algo em troca: a satisfação de dar e ver o efeito dessa dádiva em quem a recebe é impagável e insubstituível.

 

Porém também sinto… uma certa… inveja. Porque também eu queria receber aquilo que dou. E não é que eu esteja a cobrar nada a quem dou, mas... fico à espera.

E espero. E ainda bem que tenho o que fazer para me ocupar enquanto espero, de outra forma, desesperava.

Mas, inevitavelmente, às vezes desespero. Cada vez menos, no entanto.

E dou por mim a pensar: “Serei egoísta ou, efetivamente, o dar e o receber deveriam andar de braço dado, num fluxo equilibrado entre emissor e recetor?”.

Filosofias.

 

Sandrapep

 

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23.5.16

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Foto: Young Woman – Rúben Gál

 

End of story!

 

Não resisto, vou começar pelo fim: há que colocar a acentuação onde ela é devida, se queremos ser claros e diretos na mensagem a passar.

Dar e receber?

Dar é receber!!

 

Sim, gosto muito de receber, de me sentir presenteado, sem dúvida. Tenho até pena de, por vezes, demasiadas vezes até, nem me darei talvez conta de que estou a receber, não me sentir agradecido, não valorizar, como se as coisas me fossem, naturalmente, devidas.

Mas quando se dá, e então quando se percebe ou se adivinha que acertámos mesmo, quando provocamos um brilho nos olhos, aquela reação espontânea de satisfação, de espanto por parte de quem recebe, isso é uma satisfação enorme, uma quase volúpia que nos invade e preenche. É um gosto a dobrar, por nós e pelos outros. Tanto mais intenso, prolongado e proveitoso, quanto foi desinteressado. É engraçado, digamos, mas mais se ganha, quanto menos contas tivermos feito. A aritmética não é para aqui chamada. É natural, genuíno, verdadeiro.

 

Sim, que fique claro, dar é receber, é um egoísmo solidário, se me faço pobremente entender. Sem interesse, mas com uma enorme margem de lucro!

 

Jorge Saraiva

 

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20.5.16

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Foto: Smile – Mihai Paraschiv

 

A vida não me poupa a desgostos. Como todos os mortais, com mais ou menos dor, já abdiquei de coisas e pessoas. Já parti com vontade de ficar, deixei partir com vontade de agarrar. Sofri perdas e fiz lutos. Senti e partilhei solidões. E, com tudo isto, não me zango com a vida. Não é retórica, é mesmo convicção minha, que a vida sem estas experiências não é suficientemente rica. Estes “sentires” fazem parte da vida. Mau seria se no fim da minha existência não soubesse como a tristeza dói e como as lágrimas queimam a flor da pele na sua passagem.

Nestes momentos tão marcantes, a solidariedade humana, um sorriso franco e o conforto de um abraço ajudam-nos a não nos perdermos e a mantermo-nos ligados e conscientes.

Sei, por experiência, que a desgraça, enriquece-nos de atenção, mimo e afeto, dádivas tão precisas e preciosas.

Já dei acolhimento ao desgosto de amigos e já recebi a solidariedade dos seres bons nos meus momentos maus.

Mas, e os momentos bons, com quem os podemos partilhar? Quem se regozija verdadeiramente com os nossos êxitos?

As pessoas boas ajudam-nos a ultrapassar os momentos maus mas só as pessoas de espírito e natureza sãos, se alegram com os nossos êxitos e as nossas alegrias e esses, não são assim tantos.

Alegra-me com a tua alegria por me sentires alegre!

 

Cidália Carvalho

 

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18.5.16

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Foto: Child – Adina Voicu

 

Era uma vez uma menina chamada Ana que tinha apenas 3 aninhos. Num certo dia de chuva, a mãe decidiu ir com ela e com o seu irmão de 1 ano ao parque encantado do centro comercial mais próximo. Daria assim aos seus filhos uma tarde diferente de brincadeira, apenas porque o seu maior desejo é que eles estejam bem e felizes.

No parque, a Ana portou-se lindamente, tal como em todo esse fim-de-semana. Ao passar por um quiosque repleto de Minnies e Mickeys, a Ana exclamou “Que Minnie tão linda!”. A mãe ficou à espera da frase seguinte que seria “Dás-me uma?”, mas essa pergunta não chegou. Então, como a Ana estava a portar-se tão bem, decidiu dar-lhe essa prendinha apenas porque era domingo.

Quando pediu para a menina escolher o boneco, a Ana arregalou os olhos e deu-lhe um grande sorriso, que a mãe recebeu como se fosse o maior tesouro. Então ela escolheu o Mickey, que passou a ser o seu inseparável amigo.

 

No dia seguinte, a Ana pediu para levar o seu novo amigo para a escolinha para conhecer a sua professora e todos os seus amigos.

A meio da tarde, a mãe recebe um telefonema da professora avisando que a Ana foi mordida na bochecha porque mordeu as mãos de um colega. Ligou porque aquilo estava tão feio, vermelhão, com ferida e a ocupar a bochecha toda que a mãe se assustaria ao ir buscar a filha.

À noite, conversaram sobre o que se passou e a Ana contou-lhe que um colega, o seu grande amigo da escola, queria brincar com o Mickey e ela não deixou, mordendo-lhe os dedos da mão, ao que ele reagiu e mordeu a bochecha. Ora, ao perceber qual era o colega, a mãe explicou à Ana que era um dos meninos que não tem mãe nem pai, vive num sítio que tem muitos meninos e algumas pessoas a cuidar deles. “Porquê?”, perguntou a Ana. De forma simples, a Ana ficou a saber que o seu colega não teria a sorte dela em ter um Mickey ou outros bonecos só para ele. E assim adormeceu, com o seu Mickey nos braços.

 

No dia seguinte, a Ana estava muito atarefada a arranjar as coisas para a escola e disse à mãe “Hoje o Mickey vai à escola e o ursinho Ted também para o meu amigo brincar com o Mickey e eu com o Ted.” A mãe recebeu esta iniciativa com muito orgulho.

Lá foram para a escola e rapidamente a Ana foi à procura do seu amigo para brincar com ele, com o Mickey e o ursinho Ted.

Nesse final de dia, ainda no carro, a Ana contou como tudo correu bem e o seu amigo ficou muito contente por poder brincar com o Mickey, que iria dormir novamente consigo.


Sónia Abrantes

 

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16.5.16

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Foto: Exercise - Martine

 

As palavras mais simples foram-me oferecidas várias vezes de forma sublime por pessoas sublimes. A simplicidade não lhes retira estrutura, profundidade, complexidade e sabedoria. São carregadas de humildade e transportam com elas uma aura de tranquilidade intrassujeito. Apenas são simples na forma como se apresentam. Despertam uma vontade incessante de reencontro, porque não são pré- programadas e não impõem tensão. Despertam interesse e questionamento constantes. Deixam-me (ainda) sem jeito.

As palavras simples, mas profundas e sábias, transmitidas por essas pessoas sublimes deram-me, até este momento, a oportunidade de repensar relações e, até, relações de poder. Deram-me a oportunidade de redefinir o meu desempenho, de me desenvolver e de encurtar distâncias. Ensinaram-me a perceber novas formas de estar nas e com as relações e de dar e receber.

 

Obrigada a essas pessoas por me terem dado a oportunidade de receber essas palavras.

Obrigada a essas pessoas por me terem dado a oportunidade de perceber que posso dar da mesma forma, e por me sentir bem por isso.

Estas palavras recebidas de pessoas sublimes ajudaram-me a construir os meus conceitos de simplicidade e de humildade.

Sem arrogância. Sem vaidade. Sem presunção.

Com muito respeito… Ensinam e dão, essencialmente, lições de vida… apenas com as palavras mais simples!

 

Ermelinda Macedo

 

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13.5.16

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Foto: Rest – Hans Braxmeier

 

Começo por dizer… melhor, por declarar que já não aguento mais! Cheguei ao limite… melhor dizendo, sinto estar a chegar bem perto do limite e por isso é melhor fazer qualquer coisa que o evite, qualquer coisa que consiga parar-me antes da linha vermelha, do precipício que seria perde o controlo.

 

Estou cansado de ser responsável e não o quero ser mais. Eu sei que ser responsável é a atitude pessoal correta, é a forma conveniente de estar em sociedade, de estar bem com o mundo. Mas, como tudo na vida, também a responsabilidade tem um lado bom e um lado mau. E o lado mau, estou a vivê-lo agora, com dor no espírito e no corpo. Conseguirei ser, tornar-me irresponsável? Penso que sim, a tudo nos habituamos e é sempre mais fácil seguir processos de degradação do que de progresso; estes exigem de nós muito esforço. Há no ser humano uma tendência natural para a degradação; se nada fizermos, degradamo-nos, sem esforço. Para o progresso temos de fazer esforço. E eu não quero esforçar-me mais.

 

Quero dizer sempre sim e praticar sempre o não.

Quero chegar sempre tarde, cada vez mais tarde, até não chegar.

Quero comprometer-me e falhar, sempre, continuamente, até que nenhum compromisso me seja pedido, até que ninguém confie em mim, até não ter qualquer capital de confiança.

Quero começar muitas coisas, mas nunca acabar nenhuma, rigorosamente nenhuma.

Quero dizer o contrário do que penso.

Quero dizer que faço não importa o quê, pois tenho a certeza de que nada farei.

Quero não olhar, nem atentar, nem me preocupar com ninguém, seja ele quem for.

Quero viver sem preocupações, sem pagar contas, apenas como o instante me suscita que viva.

Quero viver como se não existisse mais ninguém e não houvesse amanhã.

Quero ficar deitado até ser insuportável e só então, levantar-me.

Quero caminhar, só por caminhar, até o corpo cair de cansaço.

Quero olhar o mar até enjoar e só então olhar para terra.

Quero olhar a terra até ser insuportável e então repousar na escuridão dos olhos fechados.

Quero olhar o céu quando regressar a vontade da luz.

Quero não querer, apenas reagir.

Quero ser como tantos que conheço que não querem saber.

Quero não ir mais atrás, suprir as faltas dos outros.

Quero ser tanto-me-dá.

Quero ser não-me-importa-o-quê.

Quero usar tudo como desculpa para fazer nada e ser nada.

Quero deleitar-me com o nada.

Quero ser irresponsável.

 

Fernando Couto

 

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9.5.16

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Foto: Nurse - 简体中文

 

Responsabilidade é um conceito demasiado amplo e por isso algo confuso. O mesmo prende-se com as mais variadas facetas da vida, abrangendo as mais diversas idades, contextos, estatutos, leis, etc.. É algo de universal, transversal ao passar dos dias. Contudo na maior parte das situações, o conceito em si, mescla-se noutros nomes e noutros conceitos aproximados.

Respeito pelas regras, pelos outros. Observância das leis. Direitos e deveres. Garantia de subsistência. Limites de liberdade. Apenas exemplos.

Todos estes e infinitos mais carecem e vivem de responsabilidade. Nalguns casos tangível, noutros nem por isso. Nalguns casos individual e noutros social, grupal ou comunitária.

 

A responsabilidade, assim, ampla, é incutida desde cedo. É comunicado às crianças o que delas é esperado. O comportamento adequado, o acerto pelas regras, as notas positivas, o trabalho de casa feito. Por vezes até se preza a criança que salta etapas: “é tão responsável que parece um adulto...”.

Mas antes disso vem a adolescência. A época mais ou menos conturbada do acerto da responsabilidade, ou a falta dela. Na verdade, não há grande problema. Nesta fase, quase que a responsabilidade é mesmo pela falta dela. É expetável e compreensível que assim seja.

O mesmo já não sucede na idade adulta. Algum desconto, contudo, na fase de transição! Ser-se “jovem adulto” às vezes é coisa que dá jeito. Principalmente se o individuo conseguir levar a coisa até aos 30 anos. Responsável sim, mas q.b., que a vida só se vive uma vez. Claro que aqui um efeito diferenciador do tu podes e eu não posso é, principalmente, a existência de prole. Nesse caso, meu amigo... as coisas são como são e é bom que responsabilidade não seja algo “opcional”.

Passada esta etapa transitória chega a cristalização. Integrados os modelos de responsabilidade, por exemplo laborais, familiares, sociais, etc., o individuo encontra-se no auge da responsabilização. As desculpas acabaram-se e qualquer ato transgressor e irresponsável é tido por deliberado e por vezes antecipado. O adulto pensou e fez porque assim quis. Evidentemente que, ato contínuo, a punição/consequência está igualmente no auge. E é assim que tem de ser.

 

Preparem-se os que de nós tiverem a felicidade de chegar a velhos. A fasquia volta a baixar e como que há um retorno aos saudosos tempos idos. A concorrência idade/responsabilidade faz-se pela seguinte fórmula: quanto mais velho maior o desconto. A inversão das coisas é deliciosa. Ou perniciosa? Ainda não decidi. “Ó avozinho, você está tão “taralhoco”! Não pode andar a apalpar as enfermeiras do lar! Parece que já nem se lembra que existem regras e que tem de ser responsável!”.

Não é que tenha pressa e quanto a vocês não sei. Mas se a essa responsabilidade etária chegar, aproveitarei a época dos descontos. Assim como assim, aos 80 anos já é final de coleção.

 

Rui Duarte

 

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6.5.16

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Foto: Guitar – Lorri Lang

 

Em miúda queria ser graúda muito depressa. Chegar aos 18. Ser dona de si. A única a decidir e opinar sobre o seu futuro, mas principalmente o presente.

Os sermões exasperavam-na, os conselhos desesperavam-na.

Queria ser livre como um pássaro. Queria ser. Queria o mundo, os amigos, o amor. Os 18 eram sinónimo de liberdade, independência, autonomia.

De nada valia ouvir dos mais velhos "A vida não é como pensas...".

De nada valia ouvir dos pais "Enquanto viveres cá em casa de nada te vale teres 18.".

De nada valia porque nessa idade nada vale e os conselhos entram a mil para saírem a dez mil à hora.

Não há sonhos ou desejos mais egocêntricos que os dessa idade onde se acredita ser adulto sem o ser.

 

Depois veio a vida como ela é.

Primeiro a faculdade.

Os amigos, que pareciam ser os únicos no mundo e que o seriam para sempre, deram lugar a novos amigos.

O amor, que só podia ser para a vida, ficou na escola onde não mais haveria de voltar.

O estudo, que parecia fácil até então, desdobrou-se e multiplicou-se em dificuldades. A liberdade, que imaginara tão intensamente e durante tanto tempo, não tinha afinal o cheiro dos sonhos de ontem.

Aos poucos, uma pressão que outrora vinha de fora, dos pais, deu lugar a uma voz interior que lhe falava em surdina, tantas ou mais vezes que a mãe noutros tempos: “Estudar, tens que estudar”, entre tantas outras coisas.

 

Ainda hoje não sabe o dia ou a hora da transformação. Mas recorda-se da sensação.

Foi no momento em que acreditou mergulhar na liberdade que uma voz a amarrou para a eternidade. A voz da responsabilidade.

 

Joana Pouzada

 

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2.5.16

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Foto: Car – Rhonda Jenkins

 

Ser responsável é ser o quê? Hoje em dia, muitas vezes olho à volta e parece que a responsabilidade é algo que pertence aos OUTROS. Ou seja, se as colheitas correram mal, é responsabilidade do clima; dois carros bateram, é responsabilidade do outro condutor; chegou tarde ao emprego, é culpa do trânsito; não entregou os trabalhos de casa, foi o cão que comeu.

De uma forma ou de outra, vivemos uma era de desresponsabilização. A nossa vida, com altos e baixos, subidas e descidas agrestes e imprevistas, com surpresas ao virar de cada esquina, não está para os fraquinhos. Pelo menos para os fracos de espírito, entenda-se. E portanto, no meio de tanto solavanco, existe cada vez mais a disseminada tentação de tudo e todos culpar pelo que corre mal na existência de cada um, e nunca, mas mesmo nunca, virar o foco para nós mesmos.

 

E no entanto, ser responsáveis por nós mesmos é das dádivas mais bonitas que conquistamos na vida adulta. É assumirmos o controlo, tomarmos o leme e aceitarmos que se há acontecimentos que não podemos evitar, porém podemos sempre controlar como reagimos.

Ser responsável e alcançar os nossos objetivos é sempre motivo para orgulho e grandeza, algo que um mero navegar ao sabor dos ventos nunca permite.

Somos responsáveis, quer queiramos ou não e enfiar a cabeça na areia nunca leva a grandes resultados. Podemos viver anos, décadas até, se calhar a vida toda, a rejeitar responsabilidades. Todavia, a mim parece-me certo e seguro que, nos últimos momentos, haverá sempre a agonizante dúvida sobre como teriam sido as coisas se tivéssemos ousado ter a coragem de tudo enfrentar, de respirar fundo para recuperar forças numa ou outra vala mais inesperada e nunca ceder à tentação de deixar a direção do nosso destino a acontecimentos e pessoas que nos atropelam.

Sobretudo, tenhamos sempre ânimo e empenho para assumir a responsabilidade pelos nossos amores e afetos. Aos filhos, se os adoramos como se espera, que os ensinemos a pescar em vez de lhes metermos sempre o peixinho na boca, de preferência já sem espinhas; aos companheiros, que tenhamos o respeito de assumir as nossas falhas, perdoar as deles e conversar abertamente sobre tudo. À família em geral, que sejamos meigos e compreensivos, quer com aqueles em cujas veias corre o nosso sangue, como também com a família de amigos que vamos construindo ao longo dos anos.

 

Como dizia a raposa ao Principezinho de Saint-Exupery: cativar significa criar laços. “Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...”.

Se cativamos e nos deixamos cativar, temos que estar dispostos a assumir a responsabilidade por regar as flores com quem criamos esses laços, de as proteger sempre, de nunca nos demitirmos de as acompanhar e deixar crescer.

De resto, para mim, sempre que me faltam as forças e me sinto no fim da linha ou lá perto, anima-me olhar para aqueles que amo e repetir à exaustão o meu mantra pessoal. I’m the Captain of My Soul.

 

Laura Palmer

 

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