A Saúde Mental em Portugal está, decididamente, doente! Sendo esta parte integrante de todos nós, e indissociável do contexto em que vivemos, não existem atualmente condições para que a Saúde Mental consiga manter-se em equilíbrio. A rutura a que muitas famílias e seus membros chegaram tem consequências adversas na sua capacidade de resposta face aos desafios atuais. Sendo Saúde Mental um conceito lato, que não se restringe apenas a avaliações psiquiátricas, pode sentir-se no dia-a-dia, que a Saúde Mental, não só dos indivíduos como das famílias, empresas, sociedade, país, está perturbada.
A crise mental em que imergimos, incapacita-nos de, muitas vezes, tomar rédeas da nossa vida, nos diferentes contextos. Todos sentimos que, numa determinada situação, quando há um grande desafio, mas que não temos meios de fazer face ao mesmo, nem apoios, ou seja, quando estamos num momento de crise, a luta diária leva-nos a uma sensação de exaustão. É assim no meu quotidiano, na minha profissão, no contacto com os outros, amigos, família, nas referências dadas pela comunicação social, que me apercebo que é esta a sensação geral: exaustão! A Saúde Mental em Portugal está pelas últimas! Poucas são as forças, muita é a necessidade de restaurá-las, mas diminutas são as perspetivas. Queira-se ou não, tudo está interligado, e se o país está em crise, a perturbação da nossa saúde mental, do nosso bem-estar psíquico, é ao mesmo tempo uma consequência dessa crise e um reflexo da mesma. Estamos esgotados. Nos bolsos, na alma, nas ideias, na mente. E esgotamento é inverso de produtividade. E se para os governantes, a atenção recaí no facto de as perturbações mentais resultarem em pessoas incapacitadas e daí consequências nefastas para a economia, ou seja, maior necessidade de tratamento, mais recursos gastos e menos produção ativa, para essas pessoas, para além de todas as dificuldades, o problema recai na sua incapacidade de viver. Todos os sentimentos, emoções negativas e consequências diretas para a saúde física e mental, nos seus relacionamentos pessoais e profissionais e na sua expetativa futura. Muitas pessoas não têm os apoios suficientes (e não falo só de questões económicas, embora estas não sejam de menor valor), nem os recursos internos para lidar com todos os desafios e sentimentos de desesperança, mergulhando muitas vezes em comportamentos ainda mais nefastos para a sua integridade física e psicológica e dos demais: comportamentos aditivos, desviantes, suicidários, etc.. E se assim é, mais questões se colocam àquele indivíduo, àquela família, a todos nós, sociedade. Um ciclo vicioso, portanto. Há que investir na quebra destes ciclos. Há que investir na promoção da saúde mental, na recuperação das pessoas mentalmente perturbadas, há que investir em todos nós, porque só assim investimos num país de futuro! Sem pessoas, não há nações, sem pessoas, não há economia, sem pessoas não há sociedade! E se os governantes já se aperceberam que a saúde mental é responsável pela incapacitação de pessoas ativas, com consequências adversas para os diferentes segmentos da economia, então há que investir nos recursos necessários para ajudar, primeiramente o ser humano em permanente sofrimento, de modo a minorar esse mesmo sofrimento e, em segundo lugar, promover mais e melhor saúde mental da população, para maior progresso do país.
Em Portugal não há ainda a aposta necessária neste setor. Nas notícias aumentam os relatos de suicídio, na população civil, na população reclusa, entre outros. O suicídio é um verdadeiro sinal de alerta, que não podemos ignorar. É o culminar, muitas vezes, de um sofrimento silencioso, que se arrasta no tempo. E toda a exaustão, aliada a um futuro incerto e negativo ajudará a estas estatísticas.
Ainda que a reestruturação dos serviços de saúde mental em Portugal esteja a ocorrer, o que temos para já é insuficiente. É dever do país permitir que todos os cidadãos tenham acesso a cuidados de saúde mental. Que estes recursos não se limitem apenas aos centros urbanos, deslocando muitos doentes psiquiátricos das suas localidades, fragilizando ainda mais os laços familiares. É urgente uma rede de cuidados de saúde mental mais alargada, com os devidos técnicos em atuação. Neste sentido, o Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 tem como objetivos fundamentais, os seguintes:
- Assegurar o acesso equitativo a cuidados de saúde mental de qualidade a todas as pessoas com problemas de saúde mental do país, sobretudo as que pertencem a grupos especialmente vulneráveis; Promover e proteger os direitos humanos das pessoas com problemas de saúde mental; Reduzir o impacto das perturbações mentais e contribuir para a promoção da saúde mental das populações; Promover a descentralização dos serviços de saúde mental, de modo a permitir a prestação de cuidados mais próximos das pessoas e a facilitar uma maior participação das comunidades, dos utentes e das suas famílias; Promover a integração dos cuidados de saúde mental no sistema geral de saúde, tanto a nível dos cuidados primários, como dos hospitais gerais e dos cuidados continuados, de modo a facilitar o acesso e a diminuir a institucionalização.
Para que se possa prosseguir na concretização destes objetivos é premente investir nos técnicos de saúde mental, na sua formação, assim como na disponibilização de lugares neste mercado. Tantos são os licenciados em Psicologia, por exemplo, que não têm qualquer colocação no mercado de trabalho, muito menos no sistema nacional de saúde, sendo vital usar estes recursos essenciais, contribuindo não só para a diminuição do desemprego na área, mas para melhorar as respostas ao nível da saúde mental.
Ter objetivos de promoção de maiores respostas e acesso dos cidadãos aos serviços de saúde mental, sem que haja abertura para a introdução do número de técnicos realmente necessários à execução desses objetivos, representa um grande perigo. A sobrecarga dos profissionais que já fazem parte do sistema, para além de não colmatar as reais necessidades, poderá implicar na saúde mental desses mesmos profissionais (que antes de técnicos, são também humanos), e cuja saúde mental é vital para que o serviço prestado seja de qualidade.
Na Saúde Mental, como em tantas outras áreas, há que fazer bem e pensado, para que a exaustão não seja também o cenário.
Cecília Pinto