Desde muito cedo aprendemos as regras para viver e conviver em sociedade. São-nos transmitidos os valores de uma conduta "honrada" e sem "preconceitos".
Desde muito cedo temos a capacidade de julgar, de justificar e de nos tornarmos intolerantes face a problemas a soluções que muitos não conseguem enfrentar. Somos capazes de tecer comentários e enchemo-nos de razão quando defendemos o nosso ponto de vista perante situações em que a ignorância é total, podendo-o ser, ou não, por opção.
Começamos por fingir que actos como o suicídio não existem nas nossas "redondezas", que nem de perto nem de longe roçam as nossas vidas e quando ouvimos falar que alguém se suicidou, pensamos de imediato que não existe nenhum problema assim tão "grande", ou tão "grave" que justifique tal acção, tão "cobarde" perante a vida. Os mais generosos podem comentar que nesse acto de "cobardia" existiu um acto de "coragem", por um ser humano ter conseguido infligir a si mesmo tamanha violência física.
Continuamos a divagar sobre os verdadeiros problemas, as verdadeiras causas e quando se divulga um qualquer suicídio, acabamos por nunca saber as verdadeiras razões e ficamos sempre a perguntar "o que estaria a passar na cabeça daquele ser humano?", ou "será que ninguém percebeu o caminho que estava tomar?", ou "é claro que só podia ter acabado em suicídio!".
Sempre ouvi este e aquele caso de alguém que tinha posto termo à sua vida, mas nunca parei para meditar sobre o assunto, até que de uma forma mais próxima o suicídio me bateu à porta, em forma de uma chamada telefónica, dando a conhecer que um amigo de longa data se tinha suicidado naquele dia. Não quis acreditar. Tratava-se um ser humano que sempre esteve de bem com a vida, que tinha sempre um sorriso para partilhar e que tinha um amor pela vida como eu nunca vi.
Questionei-me vezes sem conta do porquê. Depois senti imensos remorsos por nunca ter dado conta, por nunca me ter apercebido e, sobretudo, por não saber como poderia ter percebido e ter ajudado a prevenir um acto irremediável.
Foi nesse dia que decidi abrir os olhos, ver o suicídio como uma realidade e percebi que o conhecimento não "mata"; a ignorância é que pode deixar que alguém se mate.
Susana Cabral
Link deste ArtigoPor Mil Razões..., às 10:25  Comentar