Junho é o mês que associo à infância!
Quando era criança, junho era o mês das férias, dos primeiros dias de praia, das tardes passadas em casa de amigas, do início das férias em casa da tia Maria onde, com a ajuda do tio Manel, “atacava” as cerejeiras para me deliciar com o fruto a que, ainda hoje, não consigo resistir.
Foi em junho que, nos últimos dias de infância, morreu a minha avó materna, cuja figura alta e esguia, olhos esverdeados e cabelos brancos arrumados em forma de carrapito, guardo com muita saudade.
Dos seus lábios, sempre a sorrir, saíam palavras doces que pareciam música, ensinamentos preciosos que só as pessoas simples nos podem dar.
Era frequente vê-la lançar mão de ditados e dizeres populares, quer para opinar, quer para ensinar de forma sucinta e airosa.
Um dos que mais utilizava era: “Quem não arrisca não petisca”.
Durante algum tempo, achei que estas palavras estavam relacionadas com comida (“petisca”), por isso não estranhava quando, numa tentativa para que comesse a sopa, me sussurrava ao ouvido “quem não arrisca não petisca”, ao mesmo tempo que me enfiava uma colher da dita boca adentro.
Estranhava, no entanto, que a minha avó o utilizasse em situações que nada tinham a ver com alimentos. Por exemplo, quando falava do quanto me devia aplicar no estudo, não só para passar de ano mas para “ir ganhando conhecimento das coisas e do mundo”; ou quando me incentivava a trocar o triciclo pela bicicleta sem rodinhas; ou ainda, quando me tentava convencer a bordar uns paninhos com patinhos que havia comprado na retrosaria do bairro, tarefa difícil para uma miúda que como que não sentia qualquer afinidade por agulhas e linhas.
Lembro-me de algumas vezes a minha mãe ficar zangada ao ouvir o “maldito” provérbio, pois, segundo ela, existiam muitos perigos à espreita de uma criança inocente e indefesa como eu, ao que a minha avó replicava: “Ela é uma criança mas não é parva!”
Ah, como me sentia importante nesses momentos!
Fui crescendo e os ensinamentos da avó passaram a fazer cada vez mais sentido, tornando-se parte importante na minha vida.
Ajudaram-me tanto a vencer medos como a não desistir de sonhar.
Mais tarde, encontrei nesta frase do economista Peter Drucker, -“Existe o risco que você não pode jamais correr, e existe o risco que você não pode deixar de correr.” – a síntese do que julgo a minha avó me quis ensinar, de que a vida é uma grande aventura, plena de riscos, a maioria dos quais não devemos ter medo de correr, pois isso é viver, isso é o que nos ajuda a crescer e o que torna a vida interessante. Devemos abster-nos de arriscar (porque não somos “parvos”) apenas e quando o que estiver em causa for o desrespeito a nós, aos outros e ao mundo.
Talvez devido às palavras da minha avó, a verdade é que à medida que fui crescendo fui aprendendo que a vida realmente só faz sentido quando estamos dispostos a arriscar, que só os ousados, os que saem da sua zona de segurança e vão ao encontro dos seus sonhos, só estes podem dizer que viveram verdadeiramente!
A História está cheia de exemplos de pessoas que ousaram, que não tiveram nem medo de sonhar, nem medo de correr o risco de viverem os seus sonhos.
Estes foram os que chegaram mais além, os que contribuiram para a evolução do mundo e para o progresso da Humanidade: venceram porque arriscaram, cometeram erros, falharam, sofreram e encontraram na dor a coragem de que precisavam para não desisitir.
“O que não mata fortalece”!
Recentemente, numa reunião sobre empreendorismo, ouvi um orador fazer uma interessante analogia entre a vida e a música. Dizia ele que a vida tal como a música é harmoniosa porque tem ritmo, tem melodia, tem altos e baixos... “Já imaginaram uma pauta sem altos e baixos? Agora imaginem a vida da mesma forma, uma linha reta... Que som ouviriam? Eu só me lembro de um: uma linha reta e um piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii... é o som que se ouve nas máquinas dos hospitais quando alguém morre!”
Cristina Vieira (articulista convidada)