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Começa de uma maneira que, pelo menos em teoria, sabemos como é, mas na realidade não sabemos bem… óvulos e espermatozoides e ADN e carne e ossos e sangue e células e o nosso corpinho a formar-se milagrosamente num ventre cada vez maior. E depois, saltamos cá para fora, de uma maneira ou de outra, com mais ou menos pompa e circunstância e, se tivermos sorte, temos uns pais babados à nossa espera. E depois seguimos por aí fora.

A receita mágica para saírmos “bem” e, mais importante ainda, sairmo-nos “bem”, isso já é mais complexo, enigmático. Abundam as teorias, mas também as exceções. E a vida nem sempre é meiga e fácil e amiga, pode ser feia e abrutalhada e dececionante.

E vamos fazendo caminho e crescendo, umas vezes com corpos funcionais e dias sorridentes, outras vezes com tudo a correr como não queríamos.

Mas a receita mágica está aqui, nos nossos envólucros de carne e osso com uma mente e um espírito lá dentro. Nem a biologia do fenómeno está clara, mas a magia está à vista em cada um de nós: estamos. Estamos aqui, vivos. A pensar, a sonhar, a andar, a amar, a sorrir, a odiar, a sofrer, a desejar, a realizar… a viver. Estamos. Somos.

Não interessa se o pacote em que viemos é giro ou feio, gordo ou magro, mais ou menos funcional, mais ou menos brilhante, muito carismático ou algo estúpido, lúcido e decidido ou fraco e titubiante, se vemos muito bem ou estamos quase cegos, se corremos a maratona ou nos arrastamos aos tropeções. Não interessa se se degradou, se envelheceu, se lhe passou um carro por cima. Estamos e somos.

Um dia havemos de ir embora. Sobre o que acontece então, ainda mais ignorantes somos. E abundam, jorram, teorias.

Nada disso interessa para esta conversa. Esta é sobre a receita mágica que é vivermos, hoje, aqui, neste preciso momento em que escrevo, neste preciso momento em que alguém lê.

Antes de acabar este nosso breve momento de protagonismo, vivemos. Sentimos o sol quente na pele, abraçámos e beijámos pessoas que amamos, lambemos gelados, saltámos num prado verdejante, bebemos vodka até cair para o lado, tocámos piano, a brisa soprou-nos ao ouvido, tivemos sonhos e pesadelos, jogámos cartas com os amigos, tivemos filhos lindos (só pode), corremos na praia atrás do nosso cão, andámos de barco, nadámos, falámos com muita, muita gente, plantámos árvores, lemos, rimos, fizemos lutas com bolas de neve, conversámos horas infindas pela noite dentro, olhámos para as estrelas, vimos o sol a nascer, chorámos de tristeza, chorámos de felicidade, e dançámos. Dançamos muito, se tivermos sorte.

Destas coisas e de milhões de outras, são feitos os nossos últimos pensamentos. E vamos amá-las a todas, como amámos quem amamos. E vamos ter pena de não termos feito mais.

E é esta a receita mágica: o mistério feliz que somos nós. Corpo e alma, a sorver a sorte de existirmos.

 

Dora Cabral

 

Link deste ArtigoPor Mil Razões..., às 07:00  Comentar

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